Longe, à espera do improvável regresso de um amor perdido, um homem conta a sua história. A história do médico galego que se mudou para Lisboa para trabalhar, mas que se cruzou com a morte e com a loucura, num cenário com algo de boémio e muito de inexplicável. Ao mesmo tempo, divaga pelas sombras da mulher que conheceu e que morreu, fala com a tal pessoa amada que se insinua ao longo de cada frase e disserta, ainda, sobre os estranhos conceitos e costumes do lugar que elegeu para refúgio. Esta é uma história complicada... ou várias que se cruzam ao ritmo do pensamento.
Ainda que este seja um livro relativamente curto, dificilmente se poderá considerar de leitura fácil. E a razão principal é precisamente o tom de divagação que percorre todo o texto, alternando entre longas dissertações sobre os usos da Abissínia, fragmentos de recordações que nunca são exactamente explicadas e um lado introspectivo que acaba por espelhar mais de pensamentos e sentimentos que propriamente de eventos a decorrer. É, portanto, difícil acompanhar o ritmo algo errático da narrativa, por vezes pausada na distante exposição de características de um povo, outras impressionante na intensidade de alguns acontecimentos quase improvável, outras ainda disperso no discorrer de uma recordação quase poética.
Há, de facto, momentos muito bons ao longo do texto, destacando-se o que parece ser a única história relativamente completa no meio de tantos fios que se cruzam. A história de Ondina, de como esta se cruzou com o narrador e do que viria a ser o seu destino final está na base dos momentos mais cativantes do livro e, ainda que deixando muitas perguntas sem resposta, é, de entre todos os que surgem na narrativa, o elemento que mais deixa a sensação de uma história completa. É também, apesar disso, uma história que se desvela aos poucos, perdendo, por vezes, parte da sua força nas dissertações e divagações que surgem por entre os grandes momentos do enredo.
No meio de tudo isto, o que mais marca é a escrita que, se nas exposições relativas à Abissínia adopta um tom distante e explicativo, tem nos momentos mais introspectivos - e até mesmo nos ocasionais momentos de maior acção - a revelação de uma beleza quase poética e muito cativante.
Ficam, pois, sentimentos ambíguos desta leitura, e a impressão de uma história que se perde, por vezes, entre demasiadas divagações. Há, ainda assim, alguns momentos bem conseguidos ao longo do livro, que acabou por se revelar, apesar de tudo, uma leitura interessante.
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