«Não deixei, ao longo dos anos, de sonhar com o senhor que morreu ao cair da cadeira, sempre aterrorizada pela dúvida: se era a cara fria dele, a cara de morto que tinha sempre visto na televisão, porque é que o morto-vivo e o vivo-morto tinham a voz do padre António?!
E o fantasma tinha sobrevivido à Revolução, Salazar e o pároco boiando em fragmentos no nevoeiro dos meus terrores noturnos da adolescência. E só muitos anos depois é que eu percebi que os cravos não matam os fantasmas.»
“Líderes da oposição misteriosamente desaparecidos, escreveu e apagou. Os líderes de esquerda e de direita dos dois partidos fora do arco do governo encontram-se em parte incerta e não irão às urnas no próximo mês. Apagou (arco de hemisfério, urnas de enterro, prognóstico a mais.)
Escandaloso desaparecimento de líderes de oposição empobrece a democracia e compromete as próximas eleições.
Mostrou ao editor de política nacional, que franziu o sobrolho e lhe disse para começar pelo fim, que logo se via o princípio.
(…) Líderes da oposição não vão às urnas nas próximas eleições, escrevia, quando o chefe lhe segredou nas costas ou arranja sangue ou isso pouco interessa, agora.” (pág. 7)
Cecília Honório (n. 1962), professora de História, doutorada em História das Ideias Políticas, deputada, publicou, Manuel Fernandes Tomás (1771-1822), (AR/Texto Ed., 2009), Os Donos de Portugal, com outros autores (Afrontamento, 2010), A Natureza e o Homem nos caminhos do saber e do poder... (INCM, no prelo). Este é o seu primeiro romance.
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