segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Encontro em Itália (Liliana Lavado)

Inseparáveis durante a infância, Henrique e Sara seguiram caminhos diferentes e, com o passar do tempo, o contacto perdeu-se. Mas ficou sempre na memória a promessa de um reencontro futuro, de uma viagem planeada e destinada a acontecer um dia. Agora, quase que por acaso, Henrique volta a encontrar Sara numa rede social e bastam algumas mensagens para planear o regresso e a futura viagem. Mas o que Henrique não sabe é que Sara já não é a pessoa que ele recorda do passado. E que, na sua atribulada viagem a Itália, espera-o o início de uma grande revelação. E de uma missão capaz de mudar a sua percepção da vida.
Um dos aspectos interessantes deste livro é que, apesar da presença de um mistério para revelar, tudo começa por ser, inicialmente, o reencontro de dois amigos que talvez pudessem ser algo mais. Há descobertas para fazer e todo um cenário sobrenatural para explorar, mas estes são elementos que surgem já numa fase relativamente avançada do enredo. O que acontece, por isso, é que a história vive muito, e principalmente na fase inicial, das personagens e das relações entre elas. O que tem um lado bom, já que abre caminho para que as futuras surpresas possam surgir com maior naturalidade, mas também um lado menos bom, já que, à partida, há umas quantas figuras que não sobressaem propriamente pelas qualidades.
Ora, isto leva inevitavelmente a Sara. Há, de facto, um cuidado em construir explicações e motivos para aquilo em que Sara se transformou, e há também uma boa medida de traços redentores com a evolução do enredo. Ainda assim, nunca chega a haver empatia suficiente, até porque parte do que é a sua história - a tentativa de afastar todos do seu caminho - acaba por criar no leitor a mesma impressão de distância. Claro que há muitas e boas explicações para isto, e essas são parte do que faz com que a envolvência não se perca. Ainda assim, não é fácil sentir empatia para com uma personagem tão problemática.
Mas é a partir do momento em que o sobrenatural entra em cena que as coisas se tornam realmente interessantes. E por várias razões. Primeiro, porque há um vastíssimo potencial no sistema construído em torno dos anjos, com o que são e o que representam, e as teorias a eles associadas, a moldarem o cenário global numa perspectiva completamente diferente. Segundo, porque há, entre as várias figuras sobrenaturais, personagens no centro de momentos realmente marcantes. E terceiro, porque, apesar de alguns aspectos que poderiam ter sido mais aprofundados, é também da presença do sobrenatural que surgem as questões mais relevantes. 
No fim, todos os elementos convergem para uma conclusão marcante, ainda que não totalmente inesperada. E uma conclusão que, sem dar todas as respostas, ou, pelo menos, as respostas desejadas, acaba por se adequar - e, em certa medida, justificar - ao muito que sucedeu ao longo do enredo. Acaba por se estabelecer um equilíbrio, em suma, entre a simples humanidade das relações e aquilo que se esconde para lá delas.
Trata-se, portanto, de uma história em que nem tudo é perfeito, e muito menos as personagens, mas em que, entre os momentos caricatos e a emotividade que, aos poucos, se vai revelando, surgem grandes perguntas e boas respostas, num enredo cativante e, por vezes, surpreendente. A soma das partes é, por isso, uma boa leitura. 

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