Luísa é uma experiente avaliadora imobiliária e está habituada a analisar com olho crítico todas as casas que lhe são apresentadas. Mas, ao partir para Vilar de Fragas numa fase delicada da sua vida, Luísa está longe de imaginar que a espera uma casa completamente diferente. Do ponto de vista profissional, a Casa do Inglês é um achado, mas há um enigma a envolvê-la. E, à medida que vai conhecendo os habitantes da vila, Luísa começa a perceber o verdadeiro significado da casa. Uma casa que guarda pecados antigos, histórias familiares complexas - e que não precisa de ser vendida, mas libertada dos pecados daqueles que lhe estão associados.
Mais que o mistério em si, e este é também muito intrigante, a primeira coisa a despertar curiosidade nesta leitura é o tão bem caracterizado ambiente de meio pequeno, em que todos se conhecem, todos sabem (ou imaginam) a vida dos outros e há figuras que, pelo nome ou pela antiguidade, parecem ou julgam elevar-se acima dos comuns mortais. Isto é interessante, desde logo, porque reflecte a impressão que Luísa sente ao entrar como que num mundo novo, mas também pela forma como realça o impacto de todos os seus enigmas, abrindo caminho às grandes revelações que inevitavelmente sucedem aos grandes segredos.
É, aliás, deste meio fechado que surge a origem do mistério, um enigma que recua até às Invasões Francesas, mas que se estende também pelo presente e pelas muitas e delicadas associações entre as diversas personagens. É fácil, por isso, entrar na pele de Luísa, a estranha que chega para desequilibrar tudo, possivelmente levar-lhes a casa a que todos têm tão grandes pretensões e desvendar algumas das facetas mais sombrias daquela gente. O resultado é, claro, uma discreta teia de intrigas e de segredos - e um percurso feito de mistérios e de surpresas, onde não faltam estranhas crenças, manifestações sobrenaturais e... bem, uns quantos pecadores inesperados.
Ao centrar-se na casa, há uma faceta da história que acaba por passar para segundo plano: a vida pessoal de Luísa. E é aqui essencialmente que surgem os sentimentos ambíguos, não tanto pela situação do filho - que acaba por estabelecer também um notável paralelismo com a história da casa - mas pela relação com o marido, cujo comportamento e exigências nunca chega a ser devidamente enfrentado. Fica, pois, em aberto a grande pergunta do depois, um aspecto que poderia, talvez, ter sido um pouco mais explorado. Ainda assim, sendo a casa quase que a verdadeira protagonista, faz também um certo sentido que os outros aspectos assumam um papel secundário.
Intensa e intrigante, trata-se, pois, de uma história feita de grandes e pequenos enigmas: os de uma casa com um passado a preservar e os pequenos grandes segredos ocultos sob a ideia de um sítio onde todos se conhecem. Uma boa história, portanto, e um bom livro a descobrir.
Título: As Casas Também Morrem
Autora: Elsa Guilherme
Origem: Recebido para crítica
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