Verde. Cor de esperança, mas de muito mais do que isso. De amor e tentação, de perda, de desilusão, de maldições que se prolongam e que, sem ganhar forma, assombram. Verde - o discreto fio condutor que une estes dois contos, tão diversos na linha essencial do enredo, mas com tanto, afinal, em comum.
Dos dois contos que compõem este pequeno livro, o primeiro e mais extenso é Vedação. Fala de um fotógrafo e de um trabalho invulgar, em que as teias insinuantes do erotismo se conjugam com a mágoa de um amor que fugiu. Longo e bastante descritivo, tanto nos cenários como no comportamento das personagens, é um conto de ritmo bastante pausado e, envolto em enigmas do início, deixa umas quantas possibilidades sem resposta. Ainda assim, faz todo o sentido que assim seja e é difícil não se entrar no fascínio da qualidade quase onírica que parece envolver todo o cenário.
No segundo conto, Casebre, história de uma ambígua maldição familiar, muda o enredo e o ritmo acelera um pouco, mas mantém-se o mesmo equilíbrio entre um cenário quase que sonhado e uma deambulação onde pensamentos e imagens quase se misturam. As personagens, complexas como parecem ser, não são ainda assim o cerne da história. É-o o mistério, que parece ganhar vida em cada momento peculiar, em cada acaso e coincidência e no que também aqui é deixado para esclarecer.
A unir as duas histórias está o verde: discreto, manifestando-se apenas em pequenas coisas, mas com uma influência como que de assombração. E é deste pequeno verde que emergem as outras qualidades comuns: o tom ambíguo (e, por isso, intrigante), o cenário que parece estar ao mesmo tempo ali tão perto e num passado muito longínquo e uma escrita que, parecendo deambular ao ritmo dos pensamentos das personagens, sabe, ainda assim, onde pretende chegar. Ficam perguntas sem resposta? Sim. Mas é dessa natureza a vida das personagens: uma vida que é quase inevitável que se tente imaginar depois do fim.
Breve, mas surpreendentemente complexo e com um ambiente feito de sonhos que se entrelaçam com a realidade, trata-se, pois, de uma leitura cativante, feita de personagens imperfeitas na dança (também) imperfeita da vida. Gostei.
Título: A Cor Verde
Autor: Jaime Soares
Origem: Recebido para crítica
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