sábado, 29 de setembro de 2018

Atlas (Jorge Luis Borges)

Todos os lugares de uma viagem deixam, de alguma forma, a sua marca - ainda que nem sempre sejam fáceis de exprimir. E será, talvez, essa a essência deste pequeno livro, que, mais que um registo de viagens, parece formar mais um atlas de impressões, em que memórias, imagens, evocações e poemas encontram um equilíbrio delicado e cativante. Da brevidade, surge uma imagem completa, ainda que não exaustiva. E, no fim, fica a impressão de ter viajado - no espaço, mas também no tempo - sem se ter saído do sítio.
Provavelmente o aspecto mais cativante deste pequeno livro é a forma como parece possível dizer tanto em tão poucas linhas. É como se cada texto evocasse uma passagem completa, ainda que não haja grandes descrições e grande parte das referências visuais surjam das diferentes fotografias. Talvez porque a viagem não se concentra apenas no espaço físico: divaga por referências a autores, a memórias, a afectos e experiências pessoais. E, assim, a impressão que fica é a de ver aqueles momentos pelo olhar de quem os exprime: como uma memória enquadrada, completa.
Não é - e importa ter isto em mente - o que habitualmente se espera de um livro sobre viagens e talvez seja também por isso que a impressão que provoca é tão surpreendente. É que a viagem é, acima de tudo, ao mundo do autor, mas fica, ainda assim, a sensação de ter viajado. Além disso, a diversidade de imagens, de referências e até de registos faz com que pareça haver neste livro um mundo inteiro - apesar de haver certamente, para cada espaço ou referência, muito mais a contar.
E, claro, esta mistura de precisão e brevidade faz com que as páginas voem. É fácil mergulhar nesta estranha viagem e, embora fique a sensação de haver ainda mais mundo para descobrir (e basta qualquer um dos textos para gerar esta sensação), fica também a ideia de um percurso satisfatório: como que de ver pelos olhos de quem viu e, assim, ver de uma forma única.
É um livro breve, sim, e aparentemente simples. Mas há um equilíbrio tão eficaz e uma experiência tão pessoal por detrás de cada momento que, mais do que perguntas sem resposta ou cenários vistos apenas de forma velada, fica a sensação de uma viagem única. E basta isso para que a leitura valha a pena.

Título: Atlas
Autor: Jorge Luis Borges
Origem: Recebido para crítica

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