Maria Santana tornou-se bruxa mais por acção dos rumores do que por vocação e as suas capacidades vêm-lhe mais da necessidade financeira do que de um hipotético dom. Mas há um genuíno mistério à sua espera e há quem ache que só ela o pode resolver. Briolanja foi recebida pela tia, que fez dela quase escrava e morreu com uns versos enigmáticos nos lábios. Em resultado, há quem diga que o seu espírito renasceu num de três gatos nascidos por volta da hora da sua morte. É para resolver este imbróglio que Maria Santana é chamada. Mas será ela uma bruxa das verdadeiras? Afinal, as bruxas não existem... pois não?
Bastante sucinto e com partes da história narradas de diferentes pontos de vista, uma das primeiras impressões a emergir deste livro é que a sua história dava facilmente para um romance mais extenso. Do que Briolanja passou às mãos da tia, do percurso de Maria Santana, até do pensamento estranhamente científico do padre Zacarias, haveria certamente muito mais a desenvolver. Ainda assim, e apesar desta vontade que fica de conhecer as coisas um pouco mais a fundo, é interessante notar, todavia, que nada falta à história que seja essencial. Não há respostas absolutas e definitivas, é verdade. Mas, tendo em conta o tema e o ambiente, a verdade é que faz todo o sentido que assim seja.
Outro aspecto que sobressai é o curioso equilíbrio que mantém toda a narrativa na constante hesitação entre a dúvida, a certeza da existência e a negação absoluta do elemento sobrenatural. Só no final as respostas aparecem, e este enigma que se vai estendendo até lá chegar torna o enredo mais intrigante, salientando não só os comportamentos mais bizarros das personagens, mas também as múltiplas possibilidades de explicação.
Há como que uma ambiguidade constante, e não deixa de ser interessante vê-la estender-se também à própria escrita. Pausada, descritiva, oscilando entre a suposta omnisciência de um narrador que não intervém e as experiências mais próximas de duas das intervenientes, parece moldar a estranha aura de mistério que envolve toda esta pequena história. E, sendo que nenhuma das vozes é completamente fiável, adensa também o impacto das respostas que, também ambíguas, mas suficientemente esclarecedoras, surgem na fase final.
Surpreendentemente vasto para as suas oitenta páginas, trata-se, pois, de uma história de enigmas, de bruxas que talvez não sejam bruxas e de almas que renascem - ou não - no rasto que deixam no mundo. Intrigante e envolvente, uma boa leitura.
Título: Eu Creio que a Verdade Crua Cura
Autor: Nuno Sobral
Origem: Recebido para crítica
Estou emocionada com a critica! Tudo o que refere foi o motivo que nos levou a Sana Editora a selecionar este projeto. Estamos gratos pela sua análise tão pormenorizada a esta novela literária!
ResponderEliminar