A chegada de Z ao opressivo e desgastante ambiente do call center traz consigo uma inesperada lufada de ar fresco. Com o seu ar de brutamontes e a sua escassa simpatia, Z não parece ser propriamente da matéria de que os melhores amigos são feitos. Mas tudo muda com a revelação dos seus poderes mágicos. Não há grande explicação para o que Z é capaz de fazer. É-o simplesmente: capaz de curar todos os seres vivos e de se transportar para uma espécie de paraíso real. Mas, quando um conflito com os colegas resulta num acidente que, por sua vez, exige mais dos seus poderes do que Z alguma vez explorou, então a sua verdadeira natureza vem à tona. E tudo muda... mais uma vez.
É interessante reparar como, num único volume relativamente breve, os autores conseguem conter uma história que facilmente justificaria uma série inteira e, ao mesmo tempo, não deixar de fora nada de essencial. Os poderes de Z, o seu paraíso pessoal e depois a outra dimensão que os acontecimentos acabam por revelar... cada uma destas facetas justificaria por si só um desenvolvimento mais profundo. E, ainda assim, tudo parece estar lá. Porquê? Talvez porque a arte acrescenta o que os diálogos em si não dizem, com o contraste entre os diferentes mundos e a forma como o traçado das personagens reflecte a sua evolução. Ou talvez porque a mensagem mais vasta - a da amizade que tudo supera, sejam defeitos, erros ou até sinistros dons sobrenaturais - não podia ser mais clara.
Também o contraste entre as várias facetas é particularmente notável, ajudando a vincar os aspectos mais marcantes da história. O mundo do call center e o visual peculiar de Z questionam, por um lado, a rotina do trabalho demasiado exigente e sem grandes contrapartidas (soa familiar, não soa?), e por outro a distância que se cria quando nos cruzamos com algo ou alguém diferente. Já os poderes de Z, tanto na sua vertente de cura como no papel que lhe foi destinado na dimensão das trevas, realçam aspectos cruciais: o primeiro o facto de sermos sempre mais do que mostramos; o segundo a necessidade de não nos cingirmos apenas ao papel que nos atribuíram. Tudo isto numa história que parece ser muito simples, que é, de facto, muito concisa... mas que contém mundos inteiros no seu interior.
E há ainda um outro aspecto a destacar em todos estes contrastes: a história abrange três dimensões distintas e cada uma tem um traçado característico, sendo que a última e mais sombria se expande para abranger as próprias mudanças de Z. Mas é a realidade que parece... bem, mais real, o que confere aos outros elementos uma intrigante dimensão onírica. Z não está a sonhar... mas as imagens criam um ambiente tal que é quase como se nós estivéssemos, o que acrescenta também ao livro um novo toque de magia.
Às vezes, não é preciso um livro extenso ou uma série longa para abranger as complexidades de uma história. É o caso deste breve, mas fascinante, O Outro Lado de Z. Uma história aparentemente simples, mas cheia de pequenas surpresas e com uma mensagem tão forte que é impossível tirá-la da memória. Vale a pena? Mas claro que vale a pena. Sem dúvida alguma.
Título: O Outro Lado de Z
Autores: Nuno Duarte e Mosi
Origem: Recebido para crítica
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