domingo, 20 de junho de 2021

Lena (Pierre Christin e André Juillard)

Lena perdeu tudo. E a sua perda tornou-a na escolha perfeita para as missões que mais ninguém pode - ou quer - desempenhar. Agora, lança-se em longas viagens, assume identidades que não lhe pertencem, esquece-se de tudo menos do papel que lhe está destinado. E, pelo caminho, tenta influenciar o mundo nas sombras, tentando evitar o tipo de sofrimento que lhe roubou a família. Sem que ninguém o saiba, Lena está bem perto das grandes revoluções do mundo. E tem um papel crucial. Mas até quando estará disposta a continuar a desempenhá-lo?
Há algo de especialmente cativante nos labirintos de inesperado que constituem esta história (ou histórias). A missão, ainda que possa parecer linear, tem sempre as suas medidas de mistério e de perigo. O objetivo é sempre nobre, mas os meios tornam-se, por vezes, ambíguos. E quanto à história da protagonista, o passado apenas vislumbrado, mas que acaba por ser a força motriz de tudo, torna-a uma figura mais complexa e, ao mesmo tempo, mais fácil de compreender.
Outro aspeto surpreendente vem da intensidade da cor, que contrasta vivamente com o lado sombrio destas histórias. Talvez porque esse lado sombrio se manifesta sempre de forma relativamente discreta, quase que insinuada, até ao momento em que as verdadeiras intenções se manifestam e a derradeira conclusão ganha vida. O que é certo é que há uma inesperada tranquilidade na arte que contrasta com o lado sombrio da intriga e realça o secretismo que é, afinal, toda a vida de Lena.
Ainda um outro ponto a salientar é o equilíbrio entre continuidade e independência que, não sendo tão importante por se tratar de uma edição integral, não deixa, ainda assim, de ser notável. Cada história é, na sua essência, independente, mas há laços a unir os três volumes, não só pela protagonista comum, mas também nas suas escolhas e na forma como preparam o caminho para a derradeira resolução. Neste caso, trata-se de um só volume, mas, lidas separadamente (ou de forma faseada), as histórias completam-se, tendo, ainda assim, cada uma a sua própria identidade.
É um livro surpreendente, em que a aparente tranquilidade esconde uma vida secreta - como acontece também com a própria protagonista. E é também uma leitura empolgante, visualmente apelativa e cheia de laivos de inesperado, na arte, no enredo e na construção das personagens. Muito bom, em suma. E memorável.

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