segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Caderno de Mentiras (Manuel Alberto Vieira)

Breves e directos - e, contudo, com toda uma vastidão de elementos em equilíbrio. Assim são os contos deste Caderno de Mentiras. Histórias de vidas e de mortes, de momentos peculiares por entre gestos do quotidiano, da simples constatação da realidade e da poesia dos momentos surreais. São episódios, enfim, onde o concreto se funde com as abstracções do imaginário, para dar forma a um livro que, curto e de leitura acessível, se revela fascinante em todos os seus pormenores.
Basta ler o primeiro conto para reconhecer as características mais marcantes de todo o livro e aquelas que prevalecem em praticamente todos os textos. Algo de estranho na situação que serve de base ao conto, uma narração directa sem grandes elaborações e um conjunto de circunstâncias que, sem grandes momentos de introspecção, se servem dos factos para fazer reflectir. Tudo isto é visível no primeiro conto, em que poucos parágrafos servem para reflectir sobre vida e morte, coragem e poesia, equilíbrios de decisão e escolhas impossíveis. E tudo isto é visível, também, em todos os contos que se seguem, com situações diferentes e diferentes reflexões, mas sempre com os mesmos pontos fortes.
Feito de contos curtos, que, com maior ou menor aproximação à realidade, se centram essencialmente na descrição de gestos e factos, surpreende a forma como, sem grandes sentimentalismos ou considerações emocionais, o autor consegue, ainda assim, evocar toda uma série de emoções e estados de alma no leitor. É fácil imaginar a posição do homem que tem de escolher, quando nenhuma escolha é vantajosa, ou da figura eternamente perdida num dilema entre palavras diferentes. A situação pode ser estranha, mas é sempre fácil de imaginar. E também aquilo que representa, para os protagonistas brevemente apresentados, mas principalmente para quem lê a sua história, revela uma complexidade inesperada para uma narrativa tão breve. Em tudo há vários sentidos. A história narrada representa sempre algo mais. E é também aí que reside o fascínio destes contos, na forma como a improbabilidade das circunstâncias se funde com gestos e percepções facilmente reconhecíveis.
Curtos, mas com a medida certa para o que pretendem transmitir, os contos deste Caderno de Mentiras têm muito de bom para revelar. Cativantes, inesperados, e muito bem escritos, evocam o surreal e ligam-no à mais comum realidade. O resultado é uma leitura impressionante e surpreendente, em que cada história, por mais estranhos que pareçam os factos que narra, evoca sempre algo de familiar no seu interior. Brilhante, em suma.

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