segunda-feira, 1 de outubro de 2012

O Mundo Depois do Fim (Tom Perrotta)

Segundo algumas profecias, quando se aproximar o fim dos tempos, chegará uma altura em que os bons serão arrebatados para os céus, deixando aos impuros e aos pecadores a tarefa de suportar o Apocalipse  Mas como reagiriam as pessoas se o Arrebatamento realmente acontecesse? Pois é isso que sucede neste livro. Subitamente, um número considerável de pessoas desapareceu e, enquanto alguns o interpretaram como um sinal da iminência do fim do mundo, outros fizeram todos os esforços para provar que o fenómeno se devera a qualquer outra razão. Qualquer outra situação, mas nunca o Arrebatamento. E é no cenário de um mundo a tentar lidar com o que aconteceu que Kevin Garvey e a sua família são apresentados. Laurie, a esposa, juntou-se aos Remanescentes Culpados, fez um voto de silêncio e aceitou viver para lembrar à população a iminência do julgamento de Deus. Tom, um dos filhos, juntou-se a um culto cujo líder deixou que a fama lhe subisse à cabeça. Jill tomou para si todas as formas de rebelião como forma de lidar com o desaparecimento de uma amiga, mas, principalmente, com o abandono da mãe. E Kevin tenta reconstruir a sua vida naquele mundo diferente, procurando uma nova relação na figura da mulher que tudo perdeu com o Arrebatamento. Passaram três anos desde o estranho fenómeno... mas as mudanças nas suas vidas mal acabam de começar...
Basta a premissa na base da história para despertar a curiosidade relativamente a este livro. Há, no conceito do Arrebatamento, várias possibilidades e questões interessantes (partindo, desde logo, de como seriam escolhidos os que vão e os que ficam, mas também como ocorreria o fenómeno) e o autor aborda-a de forma brilhante. A situação é apresentada como um acontecimento a nível global, mas o leitor vê-a do ponto de vista dos Garvey e, inicialmente, de Laurie, que costumava ser uma céptica. A sua mudança é, pois, a maior e as possíveis razões criam uma cativante aura de mistério em torno dos Remanescentes Culpados. Além disso, ao acompanhar Laurie e a família cria-se uma proximidade com as personagens, conferindo-lhes um lado pessoal e evocando algo de empatia, o que cria um equilíbrio emocional muito bem conseguido. O Arrebatamento levou muitos e muitos dos que ficaram o sentiram, mas ver as emoções e as consequências do sucedido nos protagonistas torna mais clara a consciência desse impacto a nível emocional.
Mas nem tudo é pessoal e há, no que é vivido pelos Garvey, um reflexo do impacto global das circunstâncias e das formas mais ou menos irracionais de reacção por parte dos que ficaram. Mais uma vez, isto reflecte-se de forma particularmente clara na construção em torno dos Remanescentes Culpados, partindo de acções que passam de simples comportamentos invulgares a algo de bastante mais complexo. Mas há mais, e isso é tão evidente em modos de vida mais ou menos organizados (como o culto do Santo Wayne ou as Pessoas Descalças) como na forma como as pessoas menos apegadas a esse tipo de mudanças encaram o novo mundo. A história de Nora, com a solidão e as marcas deixadas pela perda, tem tanto ou mais impacto que o grande plano dos Remanescentes Culpados. O resultado é uma história rica, em que cada personagem representa uma reacção diferente aos factores de mudança e, de certa forma, algo maior que as suas histórias pessoais (que têm, por si só, muito de interessante).
Há, ao longo do livro, muito sobre que reflectir e a forma como o autor equilibra essas considerações  sobre crenças, mudanças e formas de estar perante a vida com um enredo envolvente, em que os acontecimentos falam mais que as palavras, é grande parte do fascínio deste livro. A isto, junte-se uma escrita fluída e o toque perfeito de humor e o resultado é uma leitura viciante, quase compulsiva. Mas há ainda um outro aspecto a referir. Se, em certa medida, os percursos das personagens se encerram num ponto de viragem, também é certo que nenhum deles é o esperado e, nalguns casos, está longe de ser uma conclusão definitiva. Isto leva a que fiquem algumas perguntas sem resposta, mas acaba também por ser o final mais adequado, pois, tal como o Arrebatamento podia ser, ou não, o prelúdio para o Apocalipse  também a mudança de rumo na vida das personagens poderá ser definitiva... ou não. 
De leitura viciante e com o melhor dos equilíbrios entre a história pessoal das personagens e a perspectiva global do que está a acontecer, esta é uma história que cativa tanto pela abordagem surpreendente ao sempre interessante tema do fim dos tempos como, e principalmente, pelo impacto da história vivida pelos seus protagonistas. Fica, pois, deste O Mundo Depois do Fim, a melhor das impressões. Recomendo.

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