Palavras e cadência podem parecer meros instrumentos para este desfiar de águas - aparentemente - silenciosas. Profundas, poder-se-á dizer, como a sombra dos poemas que compõem este livro. Pois são palavras - e ritmo - feitas de uma estranha melancolia, como de quem contempla uma vida sem a tocar realmente. E, tal como os poemas que o compõem, também a imagem que fica deste livro é mais de impressões sensoriais e emocionais - com destaque para imagens absurdamente marcantes como "A Morte não me Apanha Vivo" - do que propriamente de raciocínios fáceis de descrever.
Nunca será, pois, um livro fácil de definir, sendo certo que o que sobressai é, acima de tudo, uma voz própria. Versos curtos e poemas longos, rimas que contrastam com versos livres e, acima de tudo, uma cadência aparentemente simples que flui como uma melodia - e que, precisamente por isso, acaba por ficar na memória. Características que, isoladamente, talvez possam atribuir-se a muitos outros autores, mas que, neste caso, formam um todo particularmente equilibrado e memorável.
Claro que, sendo um conjunto relativamente extenso, apesar da relativa brevidade de alguns dos poemas, é quase inevitável que alguns aspectos se repitam. Mas, neste caso, o que surpreende é que estas repetições não cansam, marcando antes como que um ponto de regresso que serve de elo de ligação ao todo. A morte, a melancolia, o silêncio e a solidão são provavelmente os principais pilares destes poemas - e são tão vastos que, embora recorrentes, nunca tornam a leitura cansativa.
Disto resulta uma impressão interessante: é que cada poema é um todo completo, mas a leitura consecutiva de todo o livro traça a imagem de um todo maior. Cada poema é uma unidade independente, mas juntos formam uma unidade mais vasta. E, assim, tudo pertence neste livro. Tudo faz sentido. Da aparente simplicidade dos versos à intemporalidade dos temas, passando pelo registo pessoal e intimista capaz, porém, de evocar sensações universais.
Uma voz própria, uma cadência marcante e um conjunto de temas e visões que, embora individualizados, formam um todo memorável: assim se pode, pois, definir este livro, que, sob o aparente silêncio das suas águas, esconde, afinal, profundidades insuspeitas.
Título: Águas Silenciosas
Autor: Timothy Hagelstein
Origem: Recebido para crítica
Sem comentários:
Enviar um comentário