quinta-feira, 4 de abril de 2013

A Loja dos Suicídios (Jean Teulé)

Ao longo de várias gerações, os Tuvache geriram, com classe e empenho, a Loja dos Suicídios. Os tempos são negros, o mundo mudou para pior e não há muitas razões para dar valor à vida. A missão dos Tuvache é auxiliar os deprimidos e os desesperados na sua determinação em acabar com tudo. Mas tudo muda com o nascimento do filho mais novo, que, contrariamente aos irmãos, parece ser um eterno optimista, determinado a ver o lado bom em tudo. Enquanto bebé, sorria, como se houvesse algum motivo para isto. E, ao crescer, o sorriso de Alan transformou-se numa boa disposição inabalável. Boa disposição que, progressivamente, parece insinuar-se nos que o rodeiam, sabotando com entusiasmo os projectos e a missão da sua família.
O que primeiro surpreende neste pequeno livro é contraste entre o tema e o cenário sombrios e a leveza com que são desenvolvidos. E, por leveza, não quero dizer que se retire ao assunto a importância devida. Não. As questões relevantes - dos comos e dos porquês do suicídio, de um cenário em que o futuro é catastrófico porque o próprio ambiente está destruído, entre outros exemplos - estão todas elas bem claras. O que acontece é que a história criada em torno destes temas tem, na verdade, muito pouco de sombrio e esta forma descontraída de contar a história, com humor negro abundante, mas gerido com classe, realça as questões pertinentes, ao mesmo tempo que proporciona uma leitura viciante e divertida.
Claro que há ideias ligeiramente mórbidas no desenvolvimento do ramo de negócio dos Tuvache. Ainda assim, esta caracterização de uma família de deprimidos (bem, quase todos), feita de forma algo caricata, acaba por abrir caminho para um interessante percurso de mudança. A influência de Alan, com todas as peculiaridades associadas, acaba por se manifestar das formas mais inesperadas. E a forma como tudo se conclui, num momento intenso e surpreendente (mas sempre com o toque de humor que caracteriza todo o livro) revela o verdadeiro impacto dessas mudanças.
Há, portanto, algo para reflectir nesta história de aparente leveza. Mas há também entretenimento e diversão, para lá das questões importantes. Assim, a história vive tanto dessas pequenas mensagem como dos episódios caricatos e divertidos que a definem. Este equilíbrio é, no fim de contas, o que torna a leitura tão cativante. O cenário soturno, caracterizado de forma discreta e gradual, mas rico em detalhes interessantes, alia-se a um conjunto de personalidades tão peculiares como cativantes, para criar uma história leve e divertida, mas em que os pontos importantes nunca são subvalorizados. Tudo é explorado nas medidas certas, do primeiro episódio caricato aos momentos inesperados do final.
Viciante e divertido, mas, ao mesmo tempo, capaz de evocar várias questões pertinentes, A Loja dos Suicídios conjuga humor negro, personagens peculiares e um conjunto de episódios divertidos numa história que, apesar de descontraída, deixa na memória muito em que pensar. Uma pequena delícia, portanto, e um livro que prova que não faz mal brincar com temas sérios, desde que se saiba como o fazer. Brilhante.

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