quinta-feira, 15 de março de 2018

A Rapariga que Bebeu a Lua (Kelly Barnhill)

Dizem as histórias que há uma bruxa na floresta com o poder de os destruir a todos e é por isso que, todos os anos, as pessoas do Protectorado entregam em sacrifício o bebé mais novo, abandonando-o na floresta para que as bruxas - ou os animais selvagens - façam dele o que entenderem. Mas a verdade é algo diferente. A bruxa da floresta não sabe o porquê daqueles bebés abandonados e recolhe-os de facto, mas para lhes encontrar uma nova família nas Cidades Livres. Para os alimentar na viagem, dá-lhes a luz das estrelas e tudo corre bem. Até ao dia em que Xan, a bruxa, se engana e alimenta a menina com a luz da lua, tornando-a assim mágica e poderosa. Vê-se, pois, obrigada a ficar com ela, pois a sua magia tornar-se-á perigosa até que possa ser controlada. E Luna cresce - e Xan envelhece. E, embora a vida continue no Protectorado, começa a haver quem se atreva a questionar...
Provavelmente o aspecto mais cativante desta história é a sua mistura de inocência e complexidade. Inocência, porque, de início, tudo parece surgir da simplicidade de um conjunto de regras que são como são e que é preciso aceitar (sejam ou não injustas) e de uma vida que cresce sem conhecer as sombras lançadas por essas regras. Complexidade porque, à medida que o enredo avança, essa simplicidade aparente esbate-se e o lado mais sombrio da magia começa também a manifestar-se.
Disto resulta um crescendo de intensidade. De início, a história parece fluir a um ritmo bastante pausado, percorrendo momentos relevantes, mas cuja importância só se revelará numa fase mais avançada da história e apresentando possibilidades ainda pouco conhecidas das personagens. Depois, os caminhos começam a cruzar-se, a magia começa a manifestar-se de forma mais intensa e tudo converge para um ponto de viragem a partir do qual tudo terá de mudar. Aí, a leitura torna-se viciante, pois é quase irresistível a vontade de saber o que acontece a seguir. Revelam-se forças, fazem-se escolhas, o verdadeiro âmago das personagens vem a superfície... e, ainda que a magia e a inocência continuem lá, tudo aquilo que as rodeia ganha uma nova dimensão.
Há muito potencial nas personagens. Tanto, aliás, que fica uma certa curiosidade insatisfeita acerca das suas vidas antes e depois do período da história. Antain, em particular, com a sua mistura de inocência e de coragem e o seu tão impressionante crescimento, deixa uma marca especialmente profunda na memória. Ainda assim, e tendo em conta a forma como tudo termina, faz um certo sentido que o percurso passado de algumas personagens e o futuro das outras seja explorado tal como é - deixando à imaginação do leitor aquilo que falta contar, pois o essencial do que move estas personagens está lá.
Complexa e inocente, portanto, e muito cativante. Assim é a história de Luna, a rapariga que bebeu a Lua. Uma história cheia de momentos marcantes e capaz de lembrar que a magia - mesmo a das pequenas coisas - é mais poderosa do que à primeira vista poderia parecer. Vale a pena, conhecê-la, portanto. Sem dúvida alguma. 

Autora: Kelly Barnhill
Origem: Recebido para crítica

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