domingo, 14 de junho de 2015

Cifra (Mai Jia)

Descendente de génios e de loucos, Rong Jinzhen aprendeu sozinho a sua forma de compreender a matemática. Foi essa capacidade, em primeiro lugar, a revelar o seu brilhantismo. Mas o seu génio é frágil e, por mais aspirações que tenha a conduzir uma investigação capaz de abrir grandes caminhos no futuro, há como que um lugar destinado no seu percurso. Tudo muda no momento em que é recrutado para uma unidade muito secreta, onde se deverá dedicar à decifração de cifras. Aí, a sua genialidade poderá conquistar-lhe o título de herói nacional. Mas basta um fracasso para que tudo desabe. E a ruína pode vir de onde menos se espera...
Apesar do grande mistério que paira sobre toda esta história, este é um livro que está muito longe de ser o habitual thriller de espionagem. Aliás, não podia ser mais diferente. Em primeiro lugar, porque a história não é propriamente uma aventura repleta de perigos, mas antes o registo da estranha e brilhante vida da sua figura central. E, em segundo lugar, porque a criptografia pode ser a base fulcral do percurso de vida de Jinzhen - mas não é a decifração o grande objectivo final da história, e nem sequer, muitas vezes, o centro da narrativa. 
O que me leva a uma das principais particularidades deste livro: a estrutura. Ainda que Jinzhen seja o cerne de toda a história, a narrativa recua até aos seus antepassados, divaga até à história particular dos que, de alguma forma, entram no seu caminho, e expande-se para um futuro em que o protagonista já não tem grande papel a desempenhar. Em resultado, o protagonista assume o seu papel de forma gradual, e desvanece-se como memória, sem que se perca a sua imagem de figura central.
Claro que isto, associado às longas - mas interessantes - exposições sobre os meandros da criptografia ou de outras explorações matemáticas levadas a cabo pelas personagens, confere à narrativa um ritmo pausado. Dificilmente se poderá ver este livro como leitura compulsiva, até porque a abundância de pormenores e teorias exige um certo tempo para que tudo seja assimilado. Ainda assim, cria-se uma estranha envolvência, em parte devido à tal aura de mistério que resulta do percurso de Jinzhen, mas acima de tudo pela forma como, apesar da aparente distância que caracteriza a sua personalidade, se cria uma fácil empatia para com o protagonista.
E depois há a complexa teia de mistérios que rodeia não só o percurso individual de Jinzhen, mas também os que o rodeiam. Segredos deixados por revelar, identidades ocultas, acções levadas a cabo sem conhecimento dos seus supostos protagonistas... Tudo isto levanta um conjunto de questões capazes de manter acesa a vontade de saber mais. E se nem tudo encontra respostas - ou, pelo menos, as respostas desejadas - no fim, tudo faz sentido, e o equilíbrio entre o que é revelado e o que fica por dizer acaba por ser o mais adequado.
A soma de tudo isto, é um livro que exige o seu tempo e uma boa medida de concentração, mas também uma história que, apesar dos muitos pormenores e de tudo o que tem para se assimilar, facilmente conquista um lugar na memória, tanto pela estranha vida do seu protagonista, como pelo que reflecte do mundo em seu redor. Muito interessante, portanto, e muito bom. 

Título: Cifra
Autor: Mai Jia
Origem: Recebido para crítica

1 comentário:

  1. Comecei agora a ler este livro que comprei pela capa (maravilha, não me canso de a olhar) e pela matemática, claro :).
    Espero também gostar.
    Boas leituras
    Patrícia

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