Rhiannon namora com Justin há mais de um ano e habituou-se à ideia de que os seus dias se dividem entre os mais ou menos bons e os maus. Até que, um dia, tudo muda. Justin parece estranho - e não de uma maneira má. Por impulso, decidem os dois fugir da escola por um dia e ir até à praia, onde Rhiannon vive o momento romântico que, na verdade, nunca teve. Mas a mudança é momentânea. No dia seguinte, Justin parece ter voltado à triste normalidade. E, pior, não se lembra de quase nada do que aconteceu. Rhiannon começa a duvidar. E, sem saber o que se passa, dá por si ainda mais confusa quando um estranho lhe diz que o Justin que lhe deu aquele momento inesquecível não era Justin. Era ele - no corpo do seu namorado.
Contando essencialmente a mesma história de A Cada Dia, mas do ponto de vista de Rhiannon em vez do de A, este é um livro do qual se esperaria, à partida, alguma previsibilidade. Afinal, a linha geral da história é a mesma de A Cada Dia. Mas uma das coisas mais interessantes deste livro é precisamente o facto de, mesmo sabendo o que vai acontecer, haver uma perspectiva diferente para quase tudo, desde a forma como Rhiannon lida com a estranha situação de A às tribulações das suas amizades e da relação com Justin e até mesmo às inseguranças e sentimentos que guarda para si. Assim, a história não é tanto uma repetição como um complemento. E, ao conhecer os dois lados, as coisas tornam-se muito mais interessantes.
Também muito interessante é a forma como, mantendo as mesmas características essenciais de A Cada Dia - a aparente simplicidade, a escrita directa quanto baste e o foco na perspectiva pessoal - há pequenas diferenças de registo que mostram que a voz de Rhiannon é diferente da de A. A forma como se analisa a si mesma, os traços peculiares na sua maneira de organizar pensamentos e, claro, as diferenças da sua própria história pessoal, criam um muito agradável equilíbrio entre o que há de comum entre os dois livros e aquilo que os diferencia. Também isto torna a leitura mais cativante, pois permite ver as mesmas coisas por outros olhos, e também o contexto que o outro lado desconhece.
Ainda um outro ponto curioso é o papel de Justin em tudo isto, principalmente pela forma como o autor o caracteriza. Justin não é propriamente uma personagem simpática, tanto visto pelos olhos de A como pelos de Rhiannon. Mas há um óbvio cuidado em não o transformar num típico vilão, revelando todos os seus defeitos, claro, mas também as óbvias vulnerabilidades que o humanizam. Não é que isto redima a personagem - nem parece que seja esse o objectivo - mas torna-a certamente mais real.
E tudo se conclui da mesma forma que em A Cada Dia, deixando perguntas em aberto e, por isso, a ideia de que há mais história para contar, mas fechando a narrativa num momento que, tal como é, parece perfeitamente adequado às circunstâncias das personagens. Provavelmente continua, é verdade. Mas podia muito bem acabar assim.
Com uma história já conhecida, mas que se transforma em algo de novo, este é, pois, um livro que demonstra que há sempre muito mais numa história do que aquilo que julgamos saber. Cativante desde o início, emotivo em todos os momentos certos e surpreendente naquilo em que realmente precisa de ser, um complemento à altura das expectativas geradas por A Cada Dia. Muito bom.
Título: Mais Um Dia
Autor: David Levithan
Origem: Recebido para crítica
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