segunda-feira, 15 de novembro de 2010

A Nuvem Púrpura (M.P. Shiel)

Após a misteriosa morte de um dos homens que deveriam participar na expedição ao Árctico, Adam Jeffson é convidado a ocupar o seu lugar. Há um prémio destinado ao primeiro homem que alcançar o pólo e a sua noiva espera que seja Adam. Mas há também quem diga que essa expedição é maldita e que Deus exercerá a sua vingança sobre quem o desafiar. E quando Adam regressa, com o seu objectivo, o mundo foi coberto por uma tormentosa nuvem púrpura... e ninguém ficou vivo para contar o que aconteceu.
Se há algo que chama a atenção ao longo de todo este livro é a alteração da mente humana em reacção a uma solidão inevitável. Se, na sua vida normal, o carácter influenciável de Adam fazia com que ele não fosse propriamente um indivíduo decente, a forma como o seu comportamento é alterado pela descoberta de que é o único homem à face da terra é impressionante. Desde a surpresa, à angústia, à oscilação entre momentos de euforia, de paz, de obsessiva compulsão por fazer alguma coisa e, em oposição, de pura loucura destrutiva, a alteração da natureza de Adam, progressivamente menos humana, à medida que oscila entre uma deificação de si próprio e uma tendência para a monstruosidade, é descrita de forma detalhada e, por vezes, perturbadora.
Há grandes oscilações de ritmo ao longo deste livro. Começando com uma primeira parte de leitura quase compulsiva, onde os pormenores da expedição e particularmente os momentos de conflito dão vontade de ler mais e mais, a história sofre um súbito abrandamento a partir do momento em que Adam se encontra, sozinho, a divagar pelo planeta. Nesta fase, são mais vastos os momentos descritivos, o que exige uma maior atenção da parte do leitor, tanto devido às variações de cenário como à própria evolução mental do protagonista que, momento a momento, vai sendo traçada. Até que, numa fase mais avançada, ligada a um acontecimento inesperado, a história volta a ganhar intensidade e, ainda que o ritmo não chegue à força compulsiva inicial, há vários momentos marcantes que conduzem a um final bastante interessante.
Ainda uma nota para a oposição entre Adam e Leda, ela com a sua crença na bondade intrínseca da humanidade, ele com o seu pessimismo e a recusa em submeter-se ao que Leda define como a vontade do seu deus. É esta oposição, em grande parte, a definir os momentos mais marcantes da estranha relação entre os dois e é, também, causa de uma intrigante reflexão sobre o comportamento humano.
Interessante e com alguns momentos marcantes, um livro bastante denso e exigente, mas que, com os seus momentos marcantes e a sua interessante visão da natureza humana, não deixa de surpreender. Gostei.

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