Vivem-se tempos de mudança. O sultão é jovem e, com a sua chegada ao poder, houve também outros que alcançaram o sucesso, ocupando o lugar dos que foram substituídos. Mas vivem-se também tempos de mistérios, e tudo começa com a descoberta de um cadáver num poço. É esse o caso que Yashim é chamado para investigar, mas, ao tomar conhecimento do que se passa, o eunuco está longe de imaginar como é vasta a teia que começa com a descoberta daquele cadáver. Paira uma ameaça no harém do sultão, com uma mulher a assumir um papel de influência que poucos parecem compreender. E há um segredo escondido que é, ao mesmo tempo, a causa dos problemas no harém, da morte do homem no poço e de toda uma série de acontecimentos que, no fim, talvez não sejam o que parecem. Cabe a Yashim encontrar as respostas. Mas não haverá consequências negativas para aquele que se atrever a lançar luz sobre a verdade?
De todos os livros desta série, este é provavelmente o mais cativante. Em primeiro lugar, e talvez por personagens e cenário serem já conhecidos (pelo menos para quem leu os anteriores), há um maior equilíbrio entre a componente descritiva e a narração dos acontecimentos, o que confere ao enredo um ritmo mais intenso. Além disso, há algo de intrigante na forma como todas as peças do enigma vão encaixando, dando não só as esperadas respostas, mas também uma perspectiva diferente de quem são as pessoas por detrás do caso.
Claro que menos descrição não significa nenhuma descrição. Continua a haver elementos de contexto que é preciso explorar e o autor desenvolve-os ao pormenor. Neste caso, é o harém o elemento que exige uma caracterização mais detalhada e, por isso, é também a ele que diz respeito uma grande parte da descrição. Mas, e mais uma vez, devido ao tal ambiente de secretismo, também estes elementos de caracterização contribuem para adensar a aura de mistério que se sente ao longo de grande parte de enredo. E, por isso, em vez de quebrarem o ritmo da narrativa, aumentam a curiosidade em saber mais.
Quanto ao mistério e às personagens que lhe dão forma, sobressaem duas forças e uma fragilidade. As forças são, em primeiro lugar, a revelação de facetas mais complexas do que as que surgem, por vezes, um julgamento inicial bastante claro, e também a forma como personagens diferentes - e com papéis diferentes no mundo em que vivem - acabam para confluir para uma mesma resolução final. A fragilidade prende-se com alguns elos deixados por explorar, nomeadamente no que respeita ao papel de Talfa e, principalmente, ao passado de Yashim com Fevzi Ahmed. Não são informações indispensáveis ao desfecho da história, é certo. Ainda assim, teria sido interessante saber um pouco mais sobre estes aspectos. Até porque, no caso particular de Yashim, a sua história passada faz parte do que o torna um protagonista tão marcante.
Agradável e surpreendente, com um cenário fascinante e uma história que, entre uma vasta teia de intrigas e uma resolução também ela inesperada, cativa, surpreende e, em raros momentos, chega a comover, eis, pois, um mistério envolvente e intrigante, que, ao aproximar-se mais das personagens, sem perder de vista o caso, torna personagens e acontecimentos mais marcantes para o leitor. Uma boa história, em suma. E uma boa leitura.
Título: Mau-Olhado
Autor: Jason Goodwin
Origem: Recebido para crítica
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