quarta-feira, 31 de julho de 2013

O Estrangulador de Cater Street (Anne Perry)

Charlotte Ellison vive segundo as normas da sociedade a que pertence, participando dos eventos sociais e levando a vida familiar expectável do ambiente de família de classe média em que se enquadra. Mas a tranquilidade do seu lar é abalada pela notícia de que talvez haja um assassino em série por perto. Várias jovens foram estranguladas em Cater Street e as pistas seguidas pela polícia parecem indicar que o culpado está longe de pertencer às classes criminosas. Qualquer um pode ser o responsável e, mais franca e curiosa do que seria de esperar de alguém da sua condição, Charlotte toma um particular interesse pelo caso. Até porque o inspector responsável parece também ter algum interesse em Charlotte.
Apesar de ter um crime por base, há mais neste livro para além da resolução de um mistério. Na verdade, nem sempre é este a ter o protagonismo. Muito do interesse do enredo prende-se com a caracterização da sociedade, reflectida na perfeição - e nos seus múltiplos aspectos - no ambiente familiar dos Ellison. Desde a postura algo pomposa dos homens da casa à excessiva defesa da moral da mãe de Edward, passando pelos diferentes temperamentos das três irmãs, a autora explora, no seu conjunto de personagens, toda uma postura perante a sociedade. E esta contextualização, se é certo que levanta ideias pouco agradáveis no contexto actual, também o é que cria uma óptima base para o desenvolvimento da sua protagonista.
Charlotte Ellison é uma personagem forte, quer pelo carisma com que lida com as circunstâncias que a rodeiam, quer por todas as questões a que serve de porta-voz. Ao longo do enredo, Charlotte questiona a tal defesa rígida da moral, as diferentes regras para homens e mulheres, a ideia do mal e do pecado - encarnada pela peculiar figura do vigário - e até mesmo as diferenças de classe social. E o mais interessante é que não o faz só com palavras, mas, e principalmente, por acções.
Quanto ao enredo propriamente dito, o mistério entrelaça-se com este retrato das convenções sociais e também com um pouco de romance. Também aqui sobressai a caracterização das personagens, já que, ao desenvolver o carácter de outras figuras para lá da protagonista, a autora torna a história um pouco mais vasta, criando percursos igualmente interessantes para essas personagens. Além disso, e sendo este o primeiro volume de uma série, este conjunto de figuras e acontecimentos abre para os volumes que se seguirão um conjunto de possibilidades interessantes.
Quanto aos acontecimentos propriamente ditos, o ritmo é relativamente pausado, sem nunca deixar de ser envolvente. Mesmo não estando sempre em destaque, o mistério está sempre presente, criando para toda a história uma aura intrigante, que, de suspeita em suspeita, abre caminho para um bom final. Além disso, mistério e romance andam estranhamente próximas, e também a relação de Charlotte com o inspector evolui a um ritmo gradual, mas sempre cativante.
Misterioso e envolvente, O Estrangulador de Cater Street conjuga um bom retrato da sociedade vitoriana (e dos seus problemas), com uma história que equilibra as medidas certas de mistério e romance. Um muito bom início, portanto, e uma série a seguir.

terça-feira, 30 de julho de 2013

Que Monstros Fabricamos? (David Almond)

Davie e Geordie são dois rapazes normais na aldeia onde vivem. Ajudam o padre nas missas, confessam-se e, assim que viram costas, dedicam-se às pequenas maldades típicas da sua idade. No fundo, são tão inocentes como quaisquer outros rapazes. Mas tudo muda com a chega do estranho Stephen Rose, um rapaz de modos reservados e comportamentos peculiares que parece ter um interesse particular em Davie. Quase sem querer, também Davie se sente fascinado, principalmente a partir do momento em que vê as figuras que Stephen constrói no barro. O problema é que o seu novo amigo tem um lado negro e algumas capacidades peculiares e a ideia de criar vida a partir do barro pode trazer consequências indesejadas.
Com protagonistas jovens e dirigido a um público jovem, este livro é, no essencial, uma história relativamente simples, não sendo difícil de prever, em linhas básicas, o rumo dos acontecimentos centrais. Ainda assim, muito de interessante surge desta história, que a escrita simples e directa torna envolvente e a que os acontecimentos e as personagens dão uma vida particular.
A história é narrada pela voz de Davie, daí que tudo seja visto do seu ponto de vista. Tendo isto em conta, é inevitável que haja elementos da história que ficam por desenvolver, principalmente no que acontece a Stephen para lá da sua relação com Davie. Ainda assim, este tipo de narração tem também um lado positivo e este é o dar uma perspectiva mais próxima a todo o enredo. É fácil entrar no mundo de Davie, sentir os seus medos e a sua confusão. E, à medida que a história se torna mais intensa e mais sombria, também são mais fortes as emoções que transmite.
Um outro aspecto interessante é que, mesmo sendo a história centrada no enredo, sem grandes reflexões, há várias questões que se insinuam nos pensamentos do protagonista - e, em consequência, nos do leitor. A existência ou não de um deus e dos anjos e, por oposição, da maldade pura, levantam, desde logo, questões sobre os limites entre o bem e o mal. E, ao abordar estas questões do ponto de vista de um rapaz de 14 anos, o autor acrescenta-lhe uma certa inocência que, confrontada com o lado mais sombrio do enredo, acaba por se revelar particularmente tocante.
Com um enredo bastante simples, mas com muito de fascinante nas pequenas coisas, este é, assim, um livro envolvente, com uma boa história e personagens cativantes. Uma boa surpresa, portanto, e uma boa leitura.

Novidades Saída de Emergência para Agosto

Uma batalha entre dois continentes
No ano de 1565, a Europa ameaça desmoronar-se. Dividida, não consegue fazer frente a um implacável Império Otomano em expansão. Quando uma gigantesca frota turca se aproxima, toda a esperança de um continente caído em desgraça está numa minúscula ilha no meio do Mediterrâneo: Malta. E para a defender apenas restam os Cavaleiros da Ordem de Malta.
Um homem dividido
Entre os convocados para resistir e morrer está o veterano caído emdesgraça, Sir Thomas Barrett. O instinto de honra força-o a colocar a Ordem acima de tudo, mas o seu desejo secreto é o de voltar a ver a mulher que sempre amou. Para piorar tudo, é incumbido de uma missão secreta pela rainha Isabel, que vê nos Cavaleiros uma ameaça ao seu reino.
Um dia para mudar a História
Enquanto sir Thomas confronta o passado que lhe custou a honra, um grandioso exército inimigo lança o cerco à ilha. No meio de gritos e morte tudo se decidirá: o destino da fé cristã, o fim ou a glória dos Cavaleiros de Malta, e o futuro de uma Europa que nunca esteve tão próxima da aniquilação total.

Há dez anos que Margaret não tem contacto com a sua filha Erica. Esta fugiu com um jovem anarquista e vive à margem da lei no Novo México, onde terá tido uma filha. Por isso, quando numa noite fria de Janeiro encontra uma criança abandonada à porta de sua casa, Margaret acredita tratar-se da sua neta. A pequena Norah destaca-se pela sua inteligência, bondade e cedo demonstra ter habilidades extraordinárias que encantam a comunidade. Afirma ser um anjo e consegue fazer duvidar os que a rodeiam. Mas quando uma carta de Erica chega às mãos de Margaret, toda a realidade que esta criara para explicar o sucedido ameaça desmoronar-se. Pois se Erica nunca teve uma filha… quem será realmente Norah?
  
O conhecido ballet de Stravinski A Sagração da Primavera, com os seus motivos de morte e renascimento como ritos de passagem da natureza, dá título a uma das mais ambiciosas obras literárias de Alejo Carpentier (1904 – 1980), cuja trama gira em torno de dois personagens: Vera, bailarina russa que fugiu do seu país após os acontecimentos de 1917, que atua na companhia de Diaghilev, e Enrique, membro de uma família cubana endinheirada, que, por sua militância contra a ditadura de Gerardo Machado, se vê obrigado a exilar-se no Paris boémio dos anos 30.
 Uma obra na qual o autor aprofunda alguns dos mais destacados acontecimentos sociais e políticos do século XX, desde a guerra civil espanhola até à revolução cubana, refletindo-se nela o processo de iniciação artística de Carpentier e onde se exalta o vigor colossal das forças da arte e da revolução para renovar e rejuvenescer os processos históricos.

Meredith Gentry faz-se passar por uma mulher normal, em Los Angeles, onde trabalha como detective privada. Mas ela esconde segredos sobre o seu passado. Agora, alguém foi enviado para a levar de volta para casa – quer ela queira quer não. Subitamente, Meredith vê-se como um mero peão, encurralada nos planos de alguém da sua família. Vão despertar jogos de sedução, paixões ardentes, e a luxúria… Meredith terá de lutar com as maiores tentações às quais nenhuma mulher conseguiria resistir. Vai desfrutar da companhia constante dos homens mais irresistíveis que alguma vez imaginou. Vai correr perigos para além da sua compreensão. Há algo de diferente em Meredith. Algo que a torna apetecível e indispensável. Um arrebatador desejo domina este livro da primeira à última página.
  
Krynn prepara-se para a batalha decisiva contra os servos de Takhisis, a rainha das Trevas. Os nossos companheiros têm em seu poder as misteriosas e mágicas orbes e lança de dragão, mas será isso o suficiente para resistirem às forças da escuridão?
Uma batalha ainda maior encontra-se por travar no coração de cada um dos heróis. Tanis está dividido entre a perigosa Kitiara e o amor incondicional de Laurana. Raistlin prossegue a sua demanda por mais conhecimento e poder entre os magos de Krynn, mas o preço a pagar é elevado e poderá não sobreviver. Saberá Caramon, o seu irmão, até onde vai a ambição de Raistlin? Tasslehoff aprende, pela primeira vez, a sentir medo pelos seus amigos.
Com o alvorecer, novos segredos e traições, mas também grande coragem e sacrifício, serão revelados. Os deuses são testemunhas de que nada voltará a ser o mesmo em Krynn.

Há segredos na cidade de Bon Temps, segredos que ameaçam aqueles que estão mais próximos de Sookie — e que poderão despedaçar-lhe o coração... Sookie Stackhouse não pensa duas vezes antes de recusar o pedido da sua antiga colega Arlene quando esta pede que lhe devolva o seu lugar no Merlotte's. Afinal, Arlene tentou matá-la. O seu relacionamento com Eric Northman, porém, não é tão claro. Juntamente com os seus vampiros, ele mantém a distância... e um silêncio gélido. E, quando Sookie descobre porquê, sente-se devastada. É então que um homicídio chocante abala Bon Temps e Sookie é presa por esse crime. Mas as provas são débeis e sai sob fiança. Quando começa a investigar o homicídio, descobre que o que passa por verdade em Bon Temps é apenas uma mentira conveniente. O que passa por justiça é mais sangue derramado. E o que passa por amor nunca será suficiente...

A Pedra Pagã existe há centenas de anos, muito antes de três rapazes se terem reunido à sua volta e derramado sangue num pacto de irmãos, libertando inconscientemente uma força malévola desejosa de caos e destruição. Um desses rapazes, Gage Turner, foge do seu passado desde há muito tempo. Filho de um pai alcoólico abusivo, a sua infância na cidade de Hollow foi tudo menos fácil, e só a amizade com Fox e Caleb o salvaram.
Mas ao libertarem o mal sobre a sua terra natal, iniciando um ciclo de loucura e crime a cada sete anos, Gage sabe que terá que ajudar os seus amigos a salvar a cidade onde cresceu. Depois de uma vida inteira solitária, conseguirá ele criar laços emocionais com as três mulheres a quem está preso pelo destino, em especial Cybil? Uma história de amor em que só abrindo o coração se pode almejar derrotar as trevas.

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Ninguém me Conhece como Tu (Anna McPartlin)

Amigas desde a infância, Lily e Eve foram inseparáveis durante muitos anos, até ao dia em que algo de terrível as separou e destruiu a sua amizade. Passaram muitos anos, mas agora o destino quer que elas se voltem a encontrar. Eve deixou uma vida de fortuna e sucesso para voltar ao lugar onde cresceu, abrandar o ritmo da sua vida. Lily vive presa a um casamento tenso com um homem com tendências agressivas. E nenhuma delas sabe o quanto precisa da outra. Até ao dia em que Eve sofre um grave acidente de viação e se vê presa a uma cama do hospital em que Lily trabalha. Durante a longa e difícil recuperação, as duas amigas voltarão a aproximar-se e a encontrar uma na outra a força de que precisam para enfrentar novos desafios. Até porque há sempre problemas por perto.
Com uma história feita de encontros e descobertas pessoais, este livro tem, sem dúvida alguma, o seu ponto forte no aspecto emocional. Desde os momentos ternos às situações traumáticas, das personagens empáticas aos indivíduos detestáveis, a autora consegue dar vida às suas personagens e transmitir essas características ao leitor. É fácil sorrir ante as irreverências de Eve, escolher lados nos conflitos conjugais de Lily e Declan, odiar os seus comportamentos mais insuportáveis e, contudo, sentir alguma compaixão face ao seu passado. Este é, aliás, outro dos traços que torna a história tão marcante. É que, mesmo nas personagens cujo papel se aproxima do do vilão, a autora apresenta-lhes também as capacidades redentoras, criando, ao mesmo tempo, um sentido de humanidade e a curiosidade em saber se essas personagens percorrerão ou não esse tal caminho de redenção.
Parte deste lado emotivo deriva, também, do facto de a história se centrar muito nas relações entre as personagens. Há um lado romântico, inevitavelmente, e neste surpreende o facto de a autora encaminhar as coisas para um final menos fechado e menos previsível, mas há também muitos outros elos e questões. A amizade acaba por ser, por vezes, o elemento dominante, com a perda e a recuperação do contacto a fazer reflectir sobre os verdadeiros afectos. Na verdade, há na relação entre o grupo de amigos de Eve e Lily momentos tão fortes como os da história das duas, até porque a autora desenvolve estas personagens com a mesma atenção que dedica às protagonistas. E depois há a questão do casamento de Lily, toda ela uma boa base para reflexão sobre a questão da violência doméstica.
Cativante desde o início, este livro vai crescendo aos poucos em intensidade, à medida que os pontos fortes de personalidade - e até, por vezes, as suas vulnerabilidades - conquistam empatia, chamando a atenção para o que sentem e quem são. A partir desse ponto, a leitura torna-se cada vez mais viciante, para culminar num final marcante e que, mesmo sem dar todas as respostas, surpreende e comove. Uma boa história, portanto, com personagens cativantes e muitos momentos fortes para recordar. 

domingo, 28 de julho de 2013

Angelópolis (Danielle Trussoni)

Durante anos, Verlaine debateu-se entre a vontade de voltar a ver Evangeline e o conhecimento do que teria de fazer quando a encontrasse. Mas tudo se precipita no momento em que o reencontro acontece. Diante dos olhos de Verlaine, Evangeline é raptada por um dos anjos mais perigosos e levada para destino incerto. Mas antes, ela deixa-lhe uma pista, sob a forma de um ovo Fabergé. Para a encontrar, Verlaine terá de considerar todas as informações de que dispõe, travar algumas lutas perigosas e desvendar alguns segredos. E o que encontrará no fim pode não ser o que deseja.
Apesar de vários novos elementos e de um conjunto de diferenças interessantes, Angelópolis funciona, em grande medida como um volume de transição, apresentando novas informações ao mesmo tempo que coloca as peças nas devidas posições para acontecimentos por vir. Nesta medida, e em certo grau, é natural que muitas coisas fiquem em aberto, até porque parte da informação desvendada levanta novas questões. Mas é também daqui que surgem quer os principais pontos fortes, que as fragilidades.
Começando pelo lado positivo, o que mais sobressai é, sem dúvida, o desenvolvimento do sistema. Neste segundo volume, a autora continua a explorar a sua versão alternativa do funcionamento do mundo angelical e acrescenta vários elementos interessantes, quer no desenvolvimento das ligações aos Romanov, quer com as experiências (passadas e presentes), quer ainda com alguns novos segredos associados a Evangeline. Há, em tudo isto, muito de interessante e a forma como todos estes elementos se cruzam é, de facto, um dos aspectos que mais contribui para que a leitura nunca perca a envolvência.
Também nos grandes acontecimentos - e nas mudanças a eles associadas - há situações bem conseguidas, com as grandes revelações a abrir boas possibilidades para o que se seguirá. Além disso, e apesar da abundância de informação, o ritmo do enredo nunca se torna demasiado lento, talvez pela impressão de corrida contra o tempo associada à missão de Verlaine. Verlaine que, a propósito, acaba por ser o protagonista deste livro, sendo a quase ausência de Evangeline bastante notada.
Esta mudança leva às fragilidades. Sendo Evangeline uma das personagens fulcrais de Angelologia, a sua presença muito discreta neste livro deixa a sensação de um percurso que poderia ter sido mais explorado. Ao mesmo tempo, cria uma distância relativamente às personagens, até porque a história é centrada mais nos acontecimentos que nas personagens, deixando a percepção de que mais poderia ser dito a esse respeito. Há vislumbres de emotividade nas personagens, mas são elementos que surgem de forma secundária, o que, aliado a algumas pequenas incongruências, dificulta a ligação às personagens.
Há ainda bastante para explorar neste mundo, até porque muitos dos grandes acontecimentos deste livro servem como porta para novas possibilidades. Quer sobre os percursos de Evangeline e Verlaine, quer sobre os planos de anjos e angelologistas, os elementos explorados neste livro despertam, principalmente, novas questões para o que se seguirá. Também por isso acabam por ser parte do que cativa neste livro, já que criam uma agradável aura de mistério e a noção de um objectivo para certos elementos aparentemente contraditórios, ao mesmo tempo que prometem algumas surpresas para o que falta contar da história.
Da soma de tudo isto, fica a impressão de um livro menos surpreendente que o primeiro volume, mas cativante e interessante quanto baste e com muitos novos elementos a despertar curiosidade para o que se seguirá. Uma leitura agradável, portanto, e intrigante. Gostei.

Para mais informações sobre o livro Angelópolis, clique aqui.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Inferno e Paraíso (Peter S. Hawkins)

Ao longo do tempo, a Divina Comédia, de Dante Alighieri, tornou-se uma referência incontornável. Até mesmo quem não faz a mínima ideia do que seja tal livro pode dar por si a evocar certas referências à obra, ainda que não lhe conheça a origem. Mas traçar um retrato para a obra e para o autor é mais do que uma ideia geral da descida aos Infernos do poeta. Neste livro, Peter S. Hawkins consegue apresentar um retrato sucinto e esclarecedor de autor e obra, completo quanto baste, mas sem se tornar exaustivo ou maçador.
Este não é propriamente um livro destinado a académicos e estudiosos, mas antes ao leitor comum que tenha vontade de descobrir Dante e a sua grande obra. É assim que o autor define o seu objectivo e, em consequência, é inevitável que, para muitas das questões, houvesse necessariamente mais para aprofundar. Ainda assim, o autor consegue traçar um retrato muito claro, e esse é o primeiro dos muitos pontos fortes deste livro. Não fica a impressão de informação em falta, mas também não há dispersão em pormenores desnecessários. Assim, a leitura consegue ser interessante tanto para quem pouco conhece de Dante como para quem já tem algumas noções. Tanto para quem já leu a Divina Comédia como para quem nunca se aproximou.
Outro aspecto bem conseguido deste livro reside no facto de o autor não se limitar a uma exposição da vida do poeta e dos factos e interpretações essenciais da obra. O que acontece é que o autor traça a sua própria análise, cruzando os factos, os elementos do poema e as suas próprias interpretações, numa abordagem sintética, mas completa, escrita num registo agradável e num sistema organizado. Desta organização importa ainda realçar um último capítulo particularmente interessante na abordagem que apresenta à presença de Dante na arte e na literatura dos séculos após a sua morte, considerando diferentes expressões artísticas e realçando a universalidade da obra do poeta.
Ainda um último ponto a referir, e algo que contribui também para que a leitura seja sempre interessante, é o tom de proximidade e de admiração que ocasionalmente transparece das palavras do autor. Centrado nos factos ou na análise - ou na conjugação de ambos - o autor consegue ainda demonstrar o seu fascínio e a sua admiração por Dante e pela sua obra e isso transparece na forma como se expressa. É fácil reconhecer-lhe o entusiasmo e isso contagia quem lê, deixando até uma certa vontade de ler (ou reler) a Divina Comédia.
Inferno e Paraíso, é, assim, uma obra que, não sendo exaustiva nos detalhes e nas referências que desenvolve, consegue construir uma abordagem completa e precisa quer à vida de Dante, quer à sua obra maior, tudo isto num registo que cativa e desperta curiosidade. Dificilmente poderia, por isso, ser mais positiva a impressão que fica deste livro. Recomendo.

quinta-feira, 25 de julho de 2013

O Senhor Gordo de Mau Humor (François-Xavier Nève e Isabelle Charly)

 Breve, simples e directa, esta é a história - tal como o título indica - de um senhor gordo com um problema de mau humor. Mas um problema tão grande que ninguém se pode sequer aproximar. Isto é, até ao dia em que acontece um incidente muito peculiar. É uma história muito curta, em que as imagens são tão importantes como as palavras, e em que um início demasiado simples acaba por dar lugar a um final bastante bonito.
O texto é, neste livro, resumido ao essencial. E tanto o é que, a princípio, fica a impressão de alguma coisa em falta, principalmente porque o tal senhor gordo de mau humor não é propriamente uma figura simpática. Ainda assim, o ritmo agradável e as imagens que completam as palavras tornam a história cativante. Além disso, a partir de um certo ponto, tudo muda e, ainda que de forma simplificada, a forma como o lado bom das personagens acaba por se sobrepor aos seus traços desagradáveis transmite o essencial de uma mensagem positiva.
Quanto às imagens, reflectem o essencial da história e tornam-na mais viva, contribuindo para tornar a história mais interessante, o que faz delas uma parte essencial deste livro simples, mas bonito. Muita cor e alguns traços peculiares na imagem são também parte do que torna apelativo este pequeno livro.
Simples, mas cativante. É essa, afinal, a impressão que fica deste pequeno livro para pequenos leitores. Um livro interessante, com uma boa história, ainda que, talvez, um pouco breve demais. E uma leitura agradável, em suma.

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Sonhos Esquecidos (Josephine Angelini)

Todas as esperanças dos Rebentos repousam em Helena, a única capaz de descer ao Mundo dos Mortos e, talvez, parar as Fúrias, que, com o seu desejo de vingança, mantêm viva a guerra entre as Casas. Mas o seu dom tem um preço e a cada noite que Helena passa sem sonhar, em busca de respostas no Mundo dos Mortos, o seu corpo enfraquece um pouco mais. Além disso, nunca se sentiu tão sozinha. A sua relação de parentesco com Lucas dita que ambos devem estar separados, independentemente do que isso lhes custe. E, enquanto Helena tenta encontrar uma resposta, enquanto, pouco a pouco, o seu corpo enfraquece, há uma figura que a observa. É que nem só o dom de Helena a torna especial. E libertar os Rebentos do poder das Fúrias pode ser apenas uma parte do seu destino.
Seguindo na linha dos acontecimentos de Predestinados, mas com alguns desenvolvimentos interessantes, este segundo volume tem, essencialmente, as mesmas forças e fragilidades que o primeiro, ainda que em graus diferentes. As fragilidades, mais uma vez, prendem-se com o desenvolvimento de algumas atitudes dos protagonistas, um pouco excessivos na fúria e, por vezes, um pouco vagos na forma como definem as suas relações. Ainda assim, há uma evolução neste aspecto e, se é certo que a relação entre Lucas e Helena continua a definir-se por opostos - momentos de grande ternura e situações de grande fúria - , também o é que o rumo dos acontecimentos os leva a crescer um pouco.
Também por isso, e mais uma vez, o menos marcante neste livro acaba por ser o romance. E isto leva-me aos pontos fortes. A escrita continua a ser bastante simples e directa, mas o equilíbrio entre acção, contexto e descrição continua a ser bastante bom. Quanto ao contexto, as novas revelações relativas ao sistema, com todos os mistérios e capacidades inerentes aos Rebentos (e outros elementos mitológicos associados), mantêm viva a curiosidade em saber mais. Além disso, estas novas revelações repercutem-se em situações delicadas, momentos intensos e a ocasional situação emotiva marcante, tudo factores que tornam a história envolvente e interessante.
Há também uma agradável aura de mistério ao longo de todo o enredo. Cedo se percebe que a questão das Fúrias é apenas parte do problema, mas o que diz respeito ao restante é revelado de forma muito espaçada, mantendo em suspenso - e abrindo caminho para - as revelações intensas da fase final. Claro que continua a haver perguntas em aberto, até porque a série continua, mas as novas respostas são, por si mesmas e pelos momentos em que surgem, muito interessantes e deixam antever várias possibilidades intrigantes para o que se seguirá.
Intrigante e agradável, Sonhos Esquecidos segue, no mesmo estilo, mas com uma boa evolução, as linhas gerais do primeiro livro da série, acrescentando novos elementos e um percurso de crescimento a uma história bastante cativante. Fica, pois, a curiosidade em saber o que virá a seguir, e a impressão global de uma boa leitura. Gostei, portanto.

terça-feira, 23 de julho de 2013

O Que É Um Escritor Maldito? (João Pedro George)

O esquecido, o incompreendido, aquele cujo verdadeiro génio só foi reconhecido após a morte. É esse  escritor maldito. Mas será assim tão simples? Que elementos fazem com que um autor se enquadre nesse conceito? De que traços se faz essa definição? De onde surgiu, na história da literatura, e como evoluiu? E ainda, será possível considerar um escritor como maldito, se a sua história se fez antes do nascimento da definição? De todas estas perguntas e mais algumas, e das possíveis interpretações e respostas, se faz este livro.
Extenso e detalhado, com uma vastidão de referências e igual quantidade de fontes, este não é propriamente um ensaio de leitura fácil. Quer pelos muitos nomes que são referidos, quer pelos conceitos abordados, é, à partida, necessário algum conhecimento prévio a nível de certas correntes literárias. Além disso, a profusão de referências e de citações impõe ao fluxo da escrita uma certa densidade, o que torna a leitura exigente, em termos de concentração.
Nada disto retira interesse à obra. E, por várias razões. O tema é, por si só, muito interessante, e o autor explora-o de forma completa e organizada, percorrendo primeiro a aplicação mais geral do conceito e a evolução da sua percepção ao longo do tempo, para só depois considerar a presença e evolução dos considerados escritores malditos na literatura portuguesa. Além disso, se é certo que são necessários alguns conhecimentos para compreender certos conceitos e referências, também o é que é possível descobrir nomes e teorias que serão, talvez, menos conhecidas do que deveriam. Deste retrato claro e organizado, quer a nível histórico, quer de exposição de conceitos, fica um conjunto fascinante de informação e de referências e, principalmente, uma ideia muito completa do enquadramento do que define o escritor maldito no contexto da história da literatura.
E depois há todo um leque de questões a considerar, relativas à associação entre génio e miséria, entre a necessidade de uma vida de provação e o conhecimento das musas. Também estas questões, consideradas na forma como foram analisadas por diferentes protagonistas, se revelam fascinantes, introduzindo uma nova perspectiva para o tema, ao mesmo tempo que levam a considerar a inevitável multiplicidade de perspectivas no meio literário, ao longo do tempo e numa mesma época.
Interessante, completo e esclarecedor, este é, pois, um livro com uma análise clara para o conceito que lhe serve de base e que, com o seu retrato preciso dos cenários e das figuras associadas à ideia de escritor maldito, bem como pelo desenvolvimento do contexto histórico, apresenta uma perspectiva global fascinante. Muito interessante, portanto, e muito bom.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Maze Runner - Provas de Fogo (James Dashner)

Deviam estar a salvo. O medo, o perigo, a luta pela sobrevivência, tudo devia ter terminado com a fuga da Clareira. Mas o Labirinto era apenas o início e as intenções dos seus criadores continuam pouco claras. As provas da CRUEL ainda não terminaram e Thomas e os seus companheiros têm um novo desafio a superar. Um desafio que porá à prova os seus limites físicos e também tudo aquilo em que acreditam.
Partindo no ponto onde o primeiro livro terminou, este primeiro livro mantém essencialmente os mesmos pontos fortes de Maze Runner - Correr ou Morrer. O ritmo compulsivo, o estilo de escrita directo e envolvente, o enredo cheio de acção e que conduz leitor e personagens de surpresa em surpresa, e, claro, a forma de reagir das próprias personagens, são elementos que tornam este livro cativante desde a primeira página e impossível de largar até ao fim. 
Os pontos em comum com o primeiro volume são muitos. Mais uma vez, Thomas e os companheiros encontram-se em circunstâncias complicadas, a lutar pelas próprias vidas e sem saber o que podem esperar - excepto que será mau. Também a presença insondável da CRUEL, com as suas intenções ainda pouco claras para os Clareirenses e o poder que detêm sobre o grupo continua a ser um elemento fulcral. E, mais uma vez, a conjugação destes elementos serve de base a uma história de acção intensa, enigmas e revelações inesperadas - que, por sua vez darão lugar a outros enigmas -, e um ambiente bastante impressionante, quer pelo que o caracteriza, quer pela forma como o autor o explora.
A estes pontos comuns junta-se uma série de desenvolvimentos interessantes. Em primeiro lugar, novos elementos são revelados relativamente às Provas, elementos esses que estão na origem de situações bastante surpreendentes. Além disso, quer nos objectivos da CRUEL, quer no papel que Thomas e Teresa terão tido na preparação do que lhes está a acontecer, há novas revelações e novas pistas a surgir. Cada uma delas despoletando novas perguntas, o que contribui, também, e em muito para manter constante a curiosidade em saber mais.
Mas, de entre todos estes desenvolvimentos, há um que se destaca também pelo impacto emocional. É que as novas provas não dizem respeito apenas à sobrevivência e, ao desenvolver questões de empatia e afecto entre as personagens, e ao colocar em causa a confiança que estas têm entre si, o autor cria também outros níveis de tensão. Para lá da reacção ao perigo, entram elementos de traição e suspeita, o que vai introduzir novas questões e situações entre as personagens. Além de originar, por si só, momentos de uma emotividade surpreendentemente marcante.
Com grandes revelações e a mesma envolvência de escrita e de enredo, Maze Runner - Provas de Fogo é, portanto, uma sequela à altura do início da trilogia. Intenso e viciante, um livro cheio de surpresas. Muito bom.

Para mais informações sobre o livro Maze Runner - Provas de Fogo, clique aqui.

Novidade Quetzal

Como outros livros de W.G. Sebald, Os Anéis de Saturno é de impossível classificação: é ficção, viagem, biografia, mito, enciclopédia. Uma viagem a pé pelo litoral inglês de Suffolk e um relato autorreferencial transformam-se numa longa romagem melancólica por lugares da literatura, da arte e da história, as grandiosas (ou malfadadas) construções do espírito humano. 
Aqui, como em outros livros, Sebald conduz um paciente trabalho de arqueólogo, resgatando do esquecimento dos homens os prodígios da natureza e da criação lado a lado com a destruição, o horror do holocausto, da guerra, da escravatura.
O movimento exploratório do individual para o universal (e vice-versa), os grandes temas recorrentes do tempo, da memória e da identidade (inesgotáveis em si mesmos e na inimaginável riqueza de manifestações que Sebald observa) mantêm-se em Os Anéis de Saturno. Mas este será talvez o seu livro mais sombrio, mais arrebatador – e mais belo.

W.G. Sebald nasceu em 1944 em Wertach, na Alemanha. Viveu desde 1970 em Norwich, no Reino Unido, onde foi docente de Literatura Alemã. Prosador e ensaísta, é autor de livros que marcaram a literatura contemporânea, como Os Anéis de Saturno, Austerlitz, Os Emigrantes ou História Natural da Destruição, entre outros, tendo sido galardoado com os prémios literários Mörike, Heinrich-Böll, Heinrich-Heine e Joseph Breitbach.
W.G. Sebald morreu em 2001.

sábado, 20 de julho de 2013

D. Teresa de Távora - A Amante do Rei (Sara Rodi)

Desde sempre prometida ao sobrinho e destinada a honrar o nome da família onde cresceu, esperava-se de Teresa de Távora que fosse uma esposa exemplar e uma mulher devota, a Deus e à família. Mas nada disso era o que ela desejava. Sonhava o amor pelo amor, o prazer pelo prazer, a simples conquista da liberdade. E, tão ousada em alguns dos aspectos da vida, era, contudo, ingénua ao ponto de não ver que cada escolha traria as suas consequências. Para se tornar amante do rei, perderia a ligação à família. E, depois da catástrofe do terramoto e do atentado que devastaria os Távora, Teresa sobreviveria para ver o preço das suas escolhas - e viver com isso.
Narrado na primeira pessoa e num registo, por vezes, confessional, este livro cativa, em primeiro lugar, pelo retrato que traça para a sua protagonista. Teresa está longe de ser o modelo da mulher admirável e muito menos a figura que a História perpetuou por grandes feitos. É, ainda assim, uma mulher completa e os traços que lhe são atribuídos, tão invulgares face às ideias do seu tempo, tornam-na uma figura fascinante. Este retrato é um dos pontos fortes deste livro, já que, criando uma voz segura e pessoal para a sua protagonista, a autora apresenta uma personagem completa, com uma história tão vasta quanto a complexidade do seu pensamento.
Outro ponto forte é precisamente a forma como esse pensamento leva a questionar ideias e temas universais, colocados no contexto da época em que decorre o enredo. A predestinação e o livre arbítrio, analisados nas profecias de Malagrida, nas interpretações para as causas do grande terramoto e até nos principais acontecimentos da vida pessoal de D. Teresa, são analisados quer no desenvolvimento do contexto histórico, quer nas reflexões da própria protagonista. A este grande tema juntam-se ainda questões relativas ao papel da mulher na sociedade, às diferenças (e ligações) entre fé e religião e à necessidade de desenvolver um pensamento próprio face à moralidade instituída. Tudo isto é explorado ao longo da narrativa e a autora fá-lo de forma gradual, mas precisa, sem que o enredo se torne maçador, mas também sem minimizar a relevância das questões. Também isto torna a leitura interessante.
E depois há os acontecimentos, os grandes episódios da História e os momentos de revelação da história pessoal da protagonista. Todos eles narrados de uma forma muito próxima e muito marcante, com o tal tom de confissão a conferir ainda mais emotividade a momentos que são, por si mesmos, muito intensos. É fácil sentir com as personagens e pelas personagens, e, em alguns casos, ter por elas sentimentos contraditórios. E esse impacto emocional, tão gerador de ódios como de empatias, acaba também por reforçar essa intensidade e proximidade emocional que tornam a história tão envolvente.
Interessante no contexto histórico e nas questões que levanta, cativante pelo impacto emocional e pelo rumo sempre envolvente dos acontecimentos e, principalmente, marcante pelo retrato preciso e completo da sua protagonista, este é, pois, um livro que fica na memória. Cativante, surpreendente... Muito bom.

Vencedor do passatempo Angelópolis

Terminado mais um passatempo, este com 81 participações, é tempo de anunciar quem vai receber em casa um exemplar do livro Angelópolis.

E o vencedor é...

34. Ana Fortunato (Torres Vedras)

Parabéns e boas leituras!

sexta-feira, 19 de julho de 2013

O Livro do Anjo (Alfredo Colitto)

Veneza, 1313. Os corpos de três crianças crucificadas são encontrados e logo a culpa é imputada aos judeus, em geral, e em particular a Eleazar de Worms. Para esse homem, parece não haver salvação, mas há quem julgue o contrário. Adia, uma amiga, envia uma mensagem a Bolonha, onde o médico Mondino de Liuzzi, companheiro de aventuras passadas (e algo mais), exerce a sua profissão. Mondino não tarda a acorrer ao seu chamado, mas não parece ser capaz de prestar grande auxílio. E, quando, com os seus últimos esforços, Eleazar traça a sangue uma mensagem na parede da sua cela, surgem os primeiros sinais de um mistério maior. Cabe a Mondino e aos seus parcos, mas fiéis aliados, desvendar o mistério e salvar o que ainda puder ser salvo.
Cruzando elementos de thriller e de romance histórico, este livro tem um dos seus pontos fortes na caracterização bastante precisa de dois aspectos: a cidade de Veneza, tal como é vista pelas personagens, e a teia de intrigas a ela associada. O livro não é muito extenso, pelo que também as descrições não são muito longas, mas há bastante de contexto e de descrição a ser revelado ao longo do enredo. Disto resulta, inevitavelmente, um ritmo pausado, mas que, a cada nova revelação, se torna mais e mais intrigante.
Um outro aspecto interessante é o desenvolvimento do protagonista. Mondino está longe de ser a mais empática das personagens, até porque a sua atitude ao longo de todo o enredo - e salvo ocasionais excepções - acaba por ser algo distante. Há, ainda assim, no que o define, algo de interessante. É que, reputado enquanto médico e enquanto perseguidor de mistérios, Mondino está, ainda assim, longe de ser uma personagem infalível. Alguns dos seus esforços são, na verdade, lamentavelmente ineficazes, sendo essas suas falhas parte do que o diferencia.
Esta é também uma razão para que a história não se limite ao protagonista. Há, na verdade, várias personagens tão interessantes como Mondino, e igualmente relevantes para o desenvolvimento do enredo. E se, de alguns deles, fica a impressão de que mais haveria a dizer, também é certo que, particularmente relevantes para os momentos de maior intensidade, criam, com as suas próprias histórias pessoais, um ambiente mais vasto e mais intrigante para os elementos centrais do enredo.
E depois há o mistério propriamente dito. Ou os mistérios. Também aqui há elementos que poderiam, talvez, ter sido mais desenvolvidos, mas nada falta que seja essencial à história. Além disso, se o ponto de partida basta para chamar a atenção, novas intrigas se juntam ao enigma das crianças crucificadas e a forma como os diversos mistérios se cruzam, para revelar no final o que têm em comum, acaba também por proporcionar alguns momentos surpreendentes.
Trata-se, portanto, de uma boa história, com um enredo cativante, uma boa caracterização do ambiente e das personagens (ainda que deixando algumas questões em aberto), e um conjunto de mistérios que dão origem a momentos surpreendentes e intensos. Vale a pena ler, pois.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

O Palácio da Meia-Noite (Carlos Ruiz Zafón)

Dezasseis anos passaram desde que, para os proteger do perigo, a avó de Ben e Sheere os separou. Ben cresceu num orfanato, enquanto Sheere acompanhou a avó numa vida de fuga constante. Mas, agora, eles já não são crianças e o momento em que os seus caminhos se cruzam, novamente em Calcutá, é também a hora em que o seu perigoso perseguidor volta a surgir. É imperioso encontrar respostas. Felizmente, Ben e Sheere contam com amigos dispostos a muito para os ajudar na busca. Mas a história que lhes foi contada está incompleta e o seu perseguidor não é apenas um criminoso, mas algo de bem mais complexo e inexplicável.
Um dos aspectos mais fascinantes nos livros deste autor é o seu estilo de escrita. E, mesmo não sendo este um livro tão complexo como os do Cemitério dos Livros Esquecidos, é fácil reconhecer os traços desse mesmo estilo. Nos laivos de introspecção, nos ocasionais toques de poesia, na inegável mestria em evocar ambientes sombrios com um tal pormenor que os torna quase palpáveis, toda a beleza que caracteriza a escrita deste autor está aqui plenamente presente. E isso é desde logo o que faz com que, mesmo contendo uma história bem mais simples, este livro nunca deixe de ser fascinante.
Esta é uma história mais curta, e, como tal, o desenvolvimento das personagens é menos aprofundado. A história centra-se mais na aventura e no mistério, e no muito que estes elementos têm para dar. Ainda assim, o que é dito sobre as personagens é mais que suficiente e no que caracteriza a natureza de Ben e Sheere, tanto como nas relações e afectos que estes mantêm com os seus amigos, estão presentes o ímpeto e a magia da juventude, a firmeza e a lealdade das amizades puras, a convicção de que tudo é possível, mesmo em situações sombrias. Há também uma certa melancolia, natural, tendo em conta as circunstâncias das personagens, mas a quase inocência da juventude das personagens, associada à inesperada força das suas convicções, torna impressionante o percurso dos jovens protagonistas deste livro.
Há ainda o mistério e o sobrenatural, e aqui se revela outro dos pontos fortes deste livro. A natureza e as acções do misterioso perseguidor, associadas aos elementos da sua história que, progressivamente, vão sendo revelados, tornam, desde logo, intrigante toda a situação. Mas nem mesmo aí as coisas são o que parecem e há novas revelações a acontecer e novas descobertas a fazer. E a forma como cada uma delas muda o rumo dos acontecimentos - e também a percepção do passado - torna todo o enredo ainda mais interessante.
Este é, pois, um livro que, conjugando a visão quase inocente da juventude com o inevitável lado sombrio de um inimigo sobrenatural, cativa e intriga desde as primeiras páginas, e que fica na memória tanto pelas revelações surpreendentes e pela beleza da escrita como pelo afecto genuíno que o autor constrói para as suas personagens. Muito bom, portanto. Recomendo.

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Paixão Sublime (Lisa Kleypas)

Sebastian, lorde St. Vincent é o mais infame dos libertinos. Recentemente, raptou a futura esposa de um amigo, numa tentativa de a forçar a casar-se com ele. A sua situação financeira periclitante a isso o obrigou. Mas claro que não foi bem sucedido e isso só tornou as circunstâncias ainda mais difíceis. Por isso, quando a tímida e hesitante Evangeline Jenner lhe propõe um casamento de conveniência, Sebastian sabe que não pode recusar. O problema é que o acordo entre ambos - um casamento distante, sem contacto físico, e destinado apenas a atenuar a gravidade das suas circunstâncias - cedo deixará de ser satisfatório. E tanto Evie como Sebastian terão de considerar mudanças no que são e no que pretendem ser.
Tendo em conta o papel desempenhado por St. Vincent no livro anterior desta série, o que primeiro desperta curiosidade para este livro será, naturalmente, uma questão inevitável. Como poderá a autora redimir uma personagem que, anteriormente, se destacou por actos e atitudes detestáveis? Este é, desde logo, o primeiro aspecto a tornar a leitura intrigante e é também um dos pontos fortes deste livro. É que, assumidamente infame nas suas acções passadas, Sebastian é agora apresentado como uma personagem bem mais complexa, e com um percurso de redenção bastante mais interessante. Claro que parte do que define a sua má reputação continua presente, mas a autora consegue, além de revelar as suas vulnerabilidades ocultas, criar para St. Vincent uma evolução notável, em comportamentos e em valores.
Esta mudança envolve, naturalmente, a outra protagonista. E é na interacção entre Evie e Sebastian, com todos os contrastes e diferenças que os opõem, que reside outro dos pontos fortes desta história. É que, diferentes como são em muitos aspectos, os protagonistas conseguem, entre momentos de atracção e confusões e mal-entendidos que os afastam, criar momentos divertidos, situações verdadeiramente comoventes e um caminho comum que, de peripécia em peripécia, nunca deixa de ser emocionante.
Tendo em conta tudo isto, não surpreenderá, seguramente, que o romance entre os protagonistas será o foco de toda a história. Mas há mais. E também estes elementos complementares, alguns de presença mais discreta (como a questão da família de Evie), outros de importância determinante para a conclusão do enredo, contribuem para tornar a história interessante, já que acrescentam um elemento de tensão e de intriga que torna as coisas bastante mais intensas.
Envolvente e surpreendente, com um casal de protagonistas que se completa da melhor forma e uma história que é tanto de paixão como de redenção, Paixão Sublime proporciona, no fundo, uma leitura que cativa desde a primeira página e que, agradável ao longo de todo o enredo, diverte e comove nos momentos certos. Muito bom, em suma.

terça-feira, 16 de julho de 2013

Sombras da Noite Branca (Sandra Carvalho)

Aproxima-se o momento em que a profecia se concretizará e o futuro não se afigura promissor para a humanidade. Halvard, o Filho do Dragão, lançou caos e morte em todos os lugares que pisou, e as suas forças parecem ser em tudo superiores. Aproxima-se a Noite Branca, a hora em que o Conhecimento Absoluto poderá ser assimilado. E, por mais que tente, por mais soluções que procure, Kelda não vê forma alguma de deter os passos do irmão que outrora amou. Mas desistir nunca será uma opção. E, para cada nova descoberta de horror ou cada novo fracasso, Kelda descobrirá também novas forças e um laivo de esperança, ténue, mas suficiente para a manter de pé até ao momento fulcral. Muito terá de ser sacrificado para impedir a realização da profecia. Mas, mesmo contra todos, contra o seu próprio coração, Kelda está disposta a resistir - à dúvida, ao sofrimento, à tentação - e a perseverar na missão que lhe foi confiada.
Derradeiro volume de uma já longa saga, este é, naturalmente, um livro de que se esperam muitas respostas. E essas respostas são dadas, de facto. Algumas são relativamente fáceis de deduzir, outras abrem caminho a possibilidades inesperadas. Todas, em conjunto com as novas perguntas que despertam e com as respostas também a essas perguntas, servem de base a uma conclusão cativante, sempre interessante e que, apesar de um enredo de ritmo relativamente pausado, marca pelos momentos intensos e por um fortíssimo impacto emocional.
Chegados a este ponto, quase todas as personagens são já familiares. Há, ainda assim, novas revelações, desde segredos ocultos na sua natureza, a modificações operadas pelo rumo dos acontecimentos. Também isto contribui para o tal lado emotivo do enredo, já que estas novas descobertas, aliadas aos traços já conhecidos das personagens, colocam tanto a protagonista como os que a rodeiam perante escolhas e episódios marcantes. Isto acontece nos grandes acontecimentos, sendo particularmente evidente no final, mas também nas pequenas coisas, revelando forças e fragilidades que realçam a humanidade - e, como tal, a falibilidade - das personagens.
Este é também o culminar de um ambiente que, de livro para livro, se vinha tornando mais sombrio. A visão detalhada do mundo e das acções de Halvard, traçada pelo olhar de Kelda, apresenta momentos de grande crueldade, episódios macabros e situações aparentemente desesperadas. O lado das trevas é, neste livro, retratado com a máxima precisão. Isto acaba por criar um contraste interessante, quer no que opõe Halvard a Kelda, quer nos conflitos interiores da própria Kelda. Há, aparentemente, uma linha bem definida entre o bem e o mal, mas, por vezes, essa linha esbate-se, resultado daí alguns momentos muito interessantes.
E depois há a emoção, ainda e sempre, a empatia que mantém viva a ânsia de saber mais sobre o futuro destas personagens já tão próximas. Mesmo nos momentos mais negros, mesmo quando as decisões são questionáveis, há algo na história e no carácter destas personagens que consegue sempre falar ao coração. E há momentos verdadeiramente comoventes a surgir na luta de cada um deles.
Eis, portanto, uma conclusão à altura para esta longa e interessante saga. Envolvente e emocionante, com personagens fortes e momentos verdadeiramente marcantes, Sombras da Noite Branca conclui com a mesma emotividade e a mesma magia a história iniciada em A Última Feiticeira, num final belo, intenso... e muito bom.

Para mais informações sobre o livro Sombras da Noite Branca, clique aqui.

Novidade Esfera dos Livros

«Tive a minha primeira cadela, a Peggy, aos 6 anos de idade. Ia para a escola, como as outras crianças, mas só me sentia verdadeiramente feliz em casa com ela. Nos intervalos das aulas enfiava-me num canto a chorar com saudades. Parecia que a minha felicidade começava e acabava nela. Pudera! Enquanto as outras crianças me chamavam “orelhas de elefante”, o que me feria ao ponto de não conseguir conter as lágrimas, a Peggy fazia-me sentir como se fosse perfeita. Conforme fui crescendo, fui-me apercebendo de comportamentos quase humanos vindos de um animal irracional. Comportamento de total aceitação, capacidade de entrega e confiança, ausência de julgamento e preconceito, bravura, imensa capacidade para perdoar, e uma enorme sensibilidade e intuição...», in Introdução.
É o melhor amigo do homem. Um fiel companheiro de alegrias, diversão e, por vezes até, um apoio para alguns momentos de tristeza. Único e especial, assim é o meu cão. No entanto, na hora de escolher o companheiro que queremos, ou quando chegamos a casa e as coisas não correm como tínhamos imaginado, surgem sempre algumas dúvidas: Que raça devo escolher tendo em conta que vivo num apartamento pequeno e tenho dois filhos? Onde devo comprar o meu cachorro? Pela internet ou num criador certificado? A minha cadela labrador é um doce mas não acata as minhas ordens. Estou desesperada. Como devo ensiná-la a sentar? É normal o meu cocker roer os meus sapatos e destruir os brinquedos dos meus filhos? Devo alimentar o meu cão com ração ou com comida caseira? Tenho um beagle e não consigo ir passeá-lo à rua todos os dias, o exercício físico diário é realmente importante? Alexandra Santos, consultora de comportamento canino e treinadora de cães, acredita que com educação e treino adequados é possível criar um cão obediente e fiel. Num livro amplamente ilustrado, esta especialista, com vários anos de experiência, dá-lhe conselhos práticos sobre que raça escolher, quais os cuidados veterinários que deve ter em atenção, como entender a forma de comunicar do seu cão, as melhores técnicas de aprendizagem e obediência, o que deve ter em consideração quando adota um cão, cuidados a ter com o cão idoso, e muitos outros temas que o ajudarão a tornar a sua relação com o seu animar de estimação, numa relação mútua de amizade baseada na confiança, respeito e dedicação
Um guia indispensável para criar uma relação sólida e feliz com o seu cão.

Alexandra Santos é CET em Cinotecnica, na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias.Especializou-se em formação e treino de obediência no Boxer Club of Southern Africa. Possui o Diploma em Introduction to Canine Psychology (Animal Care College, U.K.), o Diploma em Intermediate Canine Psychology (Animal Care College, U.K.), o Diploma em Advanced Canine Psychology (Animal Care College, U.K.) e o Diploma em Advanced Dog Training (Companion Animal Sciences Institute, Canadá). Tem ainda o diploma em Biology of Behavior (Companion Animal Sciences Institute, Canadá) e Ethics for Dog Trainers and Behavior Consultants (Companion Animal Sciences Institute, Canadá). É membro da AABP (Association of Animal Behavior Professionals). Autora e co-autora de vários artigos publicados no Journal of Applied Companion Animal Behavior e na página do International Institute for Applied Companion Animal Behavior. É autora do livro Cachorros, publicado em Espanha por KNS Ediciones

Novidades Objectiva

Hotelle - Quarto 1 conta a história de Anabelle, uma jornalista recém-licenciada, trabalha esporadicamente como acompanhante de luxo, para ganhar algum dinheiro. O local escolhido para essas noites é o Hotel dos Encantos, onde cada quarto é dedicado a uma famosa cortesã. O cenário perfeito para a sedução. Numa dessas noites, conhece o atraente David Barlet, um magnata da comunicação. Apaixonam-se de imediato e ficam noivos, marcando a data do casamento para um mês depois. Mas quem será o enigmático homem que lhe envia mensagens eróticas, a atrai até ao hotel e a guia na descoberta da sua sexualidade através de mandamentos eróticos e sessões de exploração do corpo e dos sentidos? É possível que se tenha deixado seduzir pelo irmão do seu noivo e que esteja agora prisioneira de um arriscado jogo sexual? Acompanhe Elle na descoberta das suas fantasias pela mão de um homem misterioso e altamente sedutor.

O livro das mulheres perigosas apresenta a arte de ser uma mulher fantástica no século XXI. O livro para as mulheres que se atrevem a viver melhor
Destemido, provocador e ousado, pautado pelos sábios e eternos conselhos da filosofia e da poesia, O Livro das Mulheres Perigosas inspira-se na experiência de três mulheres perigosamente experientes para dar conselhos práticos mas divertidos que ensinam a requintada arte de viver no século XXI.
Com mais de 600 entradas sobre temas de interesse para todas as mulheres - «Amantes», «Almas Gémeas», «Poder de Atracção», «Terapia familiar», «Vestidos», «Sono», «Solteiros» e «Viajar» - este livro é o companheiro de mesa-de-cabeceira perfeito para a mulher moderna.
Mães, irmãs, filhas e amigas fazem constantemente a si mesmas, e umas às outras, perguntas sobre o que é ser uma mulher moderna. O Livro das Mulheres Perigosas tem essas respostas.

Novidade Quetzal

Uma mulher suspeita que o marido a trai e procura a polícia, convencida de que ele é também o brutal assassino de mulheres que habita as manchetes dos jornais.
O funcionário de um cartório, pai de família aparentemente exemplar, vê a sua vida transformar-se diante do ódio incontrolável que o faz aproximar-se de uma vizinha para planear minuciosamente a sua morte.
Ciúme e ódio, testemunha e perpetrador, em duas narrativas paralelas –que se cruzam de forma inesperada – e em que o sexo surge como o poderoso elo entre o assassino e a vítima.

Patrícia Melo é romancista, dramaturga, jornalista e argumentista, e uma figura de destaque na literatura brasileira contemporânea. Os seus livros foram finalistas e vencedores de importantes prémios literários dentro e fora das fronteiras do Brasil: Jabuti e Deux Óceans, entre outros.
No ano 2000, a revista Time incluiu-a na lista dos cinquenta «Líderes Latino-Americanos para o Novo Milénio».
Patrícia Melo vive actualmente entre o Brasil e a Suiça.

segunda-feira, 15 de julho de 2013

Sete Minutos (Lara Morgado)

Considerado um génio pelos poucos que o conhecem, Raul, respeitado médico numa clínica de fertilidade, é também um indivíduo bastante difícil de tolerar. Fechado, arrogante e com uma vida social quase nula, parece ser incapaz de empatia ou compaixão. Mas a sua vida está prestes a mudar. Ao descobrir, nos procedimentos do seu trabalho, um novo elemento na célula fecundada, Raul entra, sem saber exactamente como, em contacto com as almas ainda por nascer. E estas têm uma revelação para ele e uma missão para lhe confiar. É que essas almas não querem nascer e só ele pode fazer com que tal aconteça. Mas a que preço? E será possível a uma alma existir, efectivamente, sem um corpo?
O que primeiro cativa para este livro é, sem dúvida, a premissa. O estilo de escrita é, no essencial, bastante directo e sem grandes descrições, o que leva a que os elementos mais interessantes do enredo - de contextualização, de funcionamento dos chamados venturos, do próprio desenvolvimento das personagens - sejam revelados de forma bastante gradual. Assim, o que primeiro chama a atenção é precisamente essa ideia base, primeiro, da existência de um espaço reservado à alma, depois, da vontade das próprias almas.
Também o potencial das personagens se vai revelando de forma gradual. Raul não é propriamente um protagonista que desperte empatia. Muito pelo contrário, na fase inicial da narrativa, consegue ser bastante detestável. Ainda assim, a evolução da sua descoberta conduz a uma mudança no seu comportamento e se, no princípio da história, não é fácil sentir por Raul seja o que for de bom, já a fase final surpreende pela emotividade, pela empatia e, sim, pela tal compaixão que parecia impossível.
Ainda um outro aspecto importante é, claro, toda a reflexão em torno do sentido da vida e da existência de algo antes ou depois dela. Neste aspecto, a perspectiva desenvolvida é tudo menos optimista, ainda que o seu lado mais negativo seja, em grande medida, redimido pelos acontecimentos finais. Há, ainda assim, muito em que pensar, e a vastíssima complexidade do tema repercute-se nas personagens, que evoluem de uma indiferença total a uma complexidade marcante, particularmente presente na intensidade do final.
Este é, pois, um livro que, partindo de um início cativante quanto baste, cresce em força com a evolução do enredo, para culminar num final tão intenso e marcante como o impacto das inevitáveis questões que coloca. Um livro surpreendente, portanto. Muito bom.

Novidade Babel

O escritor maldito é o centro de gravidade da literatura ocidental moderna. Constitui a espinha dorsal do escritor autónomo, independente e original que defende a sua criação até às últimas consequências, sem nunca fazer concessões ou trair a sua consciência artística, não raro com prejuízo da própria vida, ou resvalando nos abismos do infortúnio e do sofrimento, ou entregando-se a todos os excessos e autodestruindo-se. Incompreendido no meu tempo mas imortalizado pelo futuro, o maldito confunde-se com a própria literatura, é a representação do trágico destino do escritor genial e da sua ressurreição.
O novo livro de João Pedro George, cujo título é copiado de Luiz Pacheco, propõe-se fazer, na primeira parte, uma geneologia das representações do escritor maldito. Qual o processo de construção do «maldito»? Que traços caracterizam o maldito e qual a imagem que o meio literário projecta do escritor maldito? Até que ponto o meio literário se reconhece, se projecta e se celebra no escritor maldito? A segunda parte é dedicada ao caso português, através da história da introdução do conceito em Portugal.

João Pedro George, doutorado em Sociologia da Cultura, foi professor na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (1998-2008). Tradutor, crítico literário e ghostwriter, dedica-se hoje exclusivamente à escrita, tendo publicado, entre outros, «O Meio Literário Português (1960-1998)», «Não é Fácil Dizer Bem: críticas, obsessões e outras ficções» e «Puta que os Pariu! A Biografia de Luiz Pacheco».

domingo, 14 de julho de 2013

Os Marginais e Outros Contos (João Melo)

Histórias de encontros, de passagens do tempo, de gente em mudança, num país em mudança. Assim são os sete contos que constituem este livro. Introspectivas, com tanto de reflexão (ou mais) que de narrativa, e tendo uma certa nostalgia presente na contemplação do passado, estas são histórias de gente diferente, mas com muito em comum com os que habitam a realidade. É isso, afinal, que as torna interessantes. Mas vamos por partes.
O primeiro conto, Trinta e cinco anos, apresenta um jantar de reencontro de companheiros e, com ele, uma bela reflexão sobre como as relações se diluem ao longo do tempo, mesmo sem acontecimentos que causem a separação. Bem escrito, com um belo toque de poesia e com uma certa nostalgia que se insinua ao longo de todo o conto. Um conto marcante, pois.
Segue-se O próximo encontro, história de um romance que começa sobre a égide do mar e que é recordado, de longe, pelos seus protagonistas. Narrado por duas vozes contrastantes, mas que se completam na mesma nostalgia, este é um conto que, bastante introspectivo, mas com a medida certa de emoção, acaba por ser também uma bela reflexão sobre os afectos.É um conto triste, mas belo na sua melancolia, e a distância entre os protagonistas e o que os move apenas reforça o impacto da história vivida por ambos.
Em Esplendor e Frustração, um jovem idealista dispõe-se a fazer tudo o que puder para melhorar o mundo em que vive, numa história que opõe as expectativas de uma missão idealizada à pura e simples realidade. De ritmo pausado, e com a já esperada nostalgia a marcar presença, perde-se, por vezes, um pouco, em divagações. A história, ainda assim, é cativante e a mensagem é forte.
Segue-se Dialética e poder, também uma reflexão, desta vez sobre o poder, na forma de um encontro entre dois antigos companheiros de luta, um deles convertido numa figura poderosa. Tal como o anterior, também este conto se perde um pouco em divagações. Ainda assim, a mensagem essencial é forte e relevante e a forma como o conto está escrito, culminando num final particularmente bom, nunca deixa de ser cativante.
Discurso sobre a beleza apresenta uma mulher que recorre à história da sua vida para analisar o conceito de beleza e as suas possíveis características. Bastante pausado e num tom algo distante, acaba por ser um conto cativante, principalmente devido a algumas ideias mais peculiares.
Em Retrato do irmão morto, um homem desfia a história do irmão,numa tentativa de atenuar a sua própria dor. Também pausado e introspectivo, ese conto surpreende principalmente pela vaga ternura que se insinua ao longo de toda a narrativa e que abre caminho para um final especialmente comovente.
Por último, Os Marginais narra também um encontro entre amigos e, através dele, o desencanto ante uma revolução que não foi a idealizada. Descritivo e de ritmo lento, mas com uma história cativante, acaba por ser uma boa conclusão para este conjunto, até porque reflecte um pouco das questões abordadas nos contos anteriores.
Eis, pois, um interessante conjunto de contos, em que a história pessoal de alguns se funde com a história de um país e em que, desde os mais emotivos aos mais divagativos, todos os contos tem algo em que reflectir. É, por isso, uma boa leitura, este Os Marginais e Outros Contos. Gostei.

sábado, 13 de julho de 2013

Números - O Caos (Rachel Ward)

Adam Marsh herdou o estranho dom da mãe. Quando olha nos olhos de alguém, consegue ver a data da morte dessa pessoa. Mas a sua capacidade peculiar não lhe tem trazido muitas vantagens. Forçado a mudar-se para Londres após uma inundação, Adam vê-se rodeado de pessoas cujo número se repete. 112027. O primeiro dia do ano que se seguirá trará catástrofe e morte à cidade de Londres. Mas quem acreditará nele, se Adam tentar avisar alguém? Além disso, ao chegar à sua nova escola, Adam cruza-se com Sarah. O número dela parece estar ligado a ele, como a promessa de algo de bom. Mas, para ela, ele é o rapaz dos seus pesadelos, aquele de quem tem de proteger o seu tesouro mais precioso... Talvez o destino de ambos seja atravessar a catástrofe juntos... ou talvez fosse preferível que os seus caminhos nunca se cruzassem.
Com um novo protagonista, mas com a mesma premissa do primeiro volume desta série, este é um livro que cativa principalmente pela peculiaridade dos dons das personagens, pelo ambiente de calamidade iminente e por um toque de ternura a contrastar com o lado mais sombrio - e, em certos momentos, dramático - do enredo. A escrita é agradável e cativante, no seu estilo bastante directo, e a narração dos acontecimentos do ponto de vista dos dois protagonistas permite um interessante contraste entre as perspectivas de ambos. Sarah e Adam têm dons diferentes, percursos diferentes  - ainda que igualmente atormentados - e ideias diferentes do que é preciso fazer. Por isso, os seus pontos de vista completam-se, tal como acontece com as suas histórias.
Quanto ao dramatismo, há alguns momentos um pouco exagerados, principalmente na fase inicial. Alguns excessos de tensão levam a comportamentos bruscos das personagens, mas estes episódios são sucedidos por outros bem diferentes. Fica, assim, por vezes, a sensação de mudanças demasiado bruscas a nível de atitude, principalmente nos momentos em que uma certa fúria adolescente acaba por se manifestar.
Há, ainda assim, bastante de interessante nas personagens, já que, excluídos os comportamentos mais excessivos, as ligações acabam por ser cativantes. Além disso, o cenário em que se movem, com a iminência da catástrofe em fundo, torna as coisas bastante mais intensas, abrindo caminho para um final bastante forte a nível emocional. Nem todos os momentos tem essa intensidade, é certo, mas há uma empatia que se vai estabelecendo relativamente às personagens, e isso contribui para manter a envolvência da história.
De tudo isto, a ideia global que fica deste Números: O Caos é a de uma história envolvente, escrita de forma agradável e com um conjunto de momentos intensos a realçar os pontos fortes de uma base interessante. Gostei, portanto.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Mil Pontos de Luz (Susana Rosária Castro)

Rudolfo tem o dom de ver a morte das pessoas. Mas não lhe serve de muito. Muitos anos antes, tentou impedir o acidente que causou a morte da mãe e dos amigos, mas falhou. Tudo o que conseguiu foi adquirir uma nova capacidade - a de ver a cor dos sentimentos de cada pessoa ao olhar-lhe para as mãos. Mas os seus dons não lhe trouxeram mais que solidão, até ao dia em que conheceu Carolina. Dona de uma luz diferente da de todos os outros, ela roubou-lhe o coração ao escolher partilhar a sua vida. Mas algo mais os une. É que Rudolfo também viu a sua própria morte e sabe que será prematura, violenta... e na mesma hora da de Carolina.
De ritmo pausado e, em grande parte, escrito em tom introspectivo, este não é propriamente um livro de leitura compulsiva. E por várias razões. Toda a história é narrada em tom de meditação, com bastante divagação a alternar com alguma descrição e sendo a presença do diálogo reduzida aos elementos essenciais. Além disso, a linha temporal nem sempre é clara, havendo avanços e recuos quer na cronologia dos acontecimentos, que, associados a ocasionais mudanças de ponto de vista entre personagens, resultam num enredo de ritmo relativamente pausado e exigente em termos de atenção.
A história é, apesar disso, bastante interessante. Primeiro, pelo elemento sobrenatural associado ao dom de Rudolfo, algo que, não sendo totalmente novo, chama a atenção, ainda assim, por algumas peculiaridades, bem como pelos bons momentos que proporciona e pela inevitável reflexão em torno da morte. Além disso, há um agradável equilíbrio entre romance e mistério que, surgindo por entre o lado mais introspectivo da narrativa, acaba por despertar momentos de maior intensidade, criando para as personagens uma história mais marcante.
Também a escrita surpreende pelos ocasionais momentos de poesia e pelo tom que é, na generalidade, agradável. Há algumas gralhas, mas pouco frequentes, felizmente, pelo que não chegam a quebrar muito o ritmo de leitura. Além disso, o tal registo introspectivo consegue também surpreender, já que é possível, nos melhores momentos, detectar uma voz própria associada às diferentes personagens.
Misterioso e envolvente, com personagens bastante interessantes e alguns momentos especialmente bons, Mil Pontos de Luz é, em suma, uma leitura agradável, ainda que não viciante, e que surpreende, principalmente, pela poesia de certas palavras e pela força de algumas situações. Gostei.

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Londres, 1850 (Sebastian Rook)

1850. Um navio fantasma alcança o porto de Londres. Dele sai um numeroso bando de morcegos, depois um homem de aspecto sombrio. Por fim, um rapaz cambaleante, quase a cair de fome e com uma história terrível para contar. O nome dele é Benedict Cole e acaba de chegar do México, onde a expedição de que fazia parte despertou um poder terrível. Camazotz, o deus vampiro dos maias retornou à vida e acaba de chegar a Londres com os seus servos. E só Ben sabe. E poucos acreditarão. Por isso mesmo, só ele poderá impedir a catástrofe. Mas como?
Relativamente breve e escrito num estilo bastante directo, este é um livro que, sendo orientado para um público jovem, cativa, em primeiro lugar, por não simplificar demasiado as coisas. O tema do vampirismo é algo de relativamente comum, mas a forma como é desenvolvido, com a associação à mitologia maia e uma curiosa fusão entre esses elementos e as características mais conhecidas da figura do vampiro, contribui em muito para tornar a história cativante.
Também as personagens têm bastante de interessante. Ainda que a história gire mais em termos de acontecimentos do que de personalidades, ficando, por vezes, a impressão de haver ainda muito a dizer sobre os protagonistas, tanto Ben e os seus aliados como o temível Camazotz tem traços que os individualizam e pontos fortes que os tornam intrigantes. Há, além disso, um elemento emocional a crescer, na relação de amizade entre Jack, Ben e Emily, relação essa que se reflecte em alguns momentos particularmente bons.
Este livro é o primeiro de uma série e, como tal, é natural que fiquem perguntas sem resposta. Ainda assim, a linha essencial da história deste primeiro volume tem um início definido e um final para os objectivos principais. Isto torna as coisas interessantes, já que não fica demasiado em aberto, havendo uma conclusão para as circunstâncias e acções das personagens, mas há, desde logo, várias possibilidades interessantes a surgir relativamente aos livros que se seguirão.
Agradável e cativante, com um ambiente intrigante, bastante acção e um conjunto de personagens interessantes, Londres, 1850, é, pois, um início muito promissor para uma série que parece ter ainda muito mais para dar. Uma boa leitura, portanto. Gostei.

Novidades Bizâncio para Julho

Título: Transforme-se num Detector de Mentiras
Subtítulo: e domine as técnicas para desmascarar os mentirosos que o rodeiam
Autor: Janine Driver
ISBN: 978-972-53-0527-0 
Págs.: 352
Preço: Euros 15,09 / 16,00
Psicologia / Auto-ajuda

«Janine tem o dom de ensinar e mais uma vez tornou a detecção da mentira numa coisa divertida, interessante e útil.» 
Joe Navarro, agente especial do FBI reformado e autor do bestseller internacional What Every BODY is Saying

O que diria de: aumentar o seu vencimento, dar um chuto nos problemas e preocupações e dormir melhor à noite, aprendendo simplesmente a detectar uma mentira mal a vê (ou mesmo antes)? E que tal se tivesse à sua disposição um teste fácil de usar que o avisasse assim que alguém lhe tenta esconder alguma coisa? Um detector de mentiras inato, tão poderoso, que se transforma numa competência inconsciente, aplicável a qualquer pessoa, em qualquer situação, capaz de o ajudar a agir depressa, antes que aquilo que começou por ser uma mentirinha piedosa subitamente se apodere de si, do seu livro de cheques, da sua felicidade?
 Nenhuma máquina construída até à data se revelou mais eficaz do que um detector de mentiras humano, afirma Janine Driver, ex-investigadora criminal dos EUA, que já deu formação a agentes da CIA e do FBI. Transforme-se Num Detector de Mentiras mudará a sua forma de encarar candidatos a empregos, colegas de trabalho, parceiros sentimentais, vendedores, gestores financeiros — todos aqueles de quem esperamos, e merecemos, a verdade — ao mesmo tempo que reforçará e aprofundará os seus relacionamentos pessoais com irmãos, filhos, amigos e amores.

Título: Chorar, Estremecer, Morrer
Autor: Um Guia para quem gosta de Ópera e, sobretudo, para quem acha que é uma estopada
ISBN: 978-972-53-0528-7 
Págs.: 224
Preço: Euros 13,21 / 14,00
Música

«Não consigo perceber por que razão as pessoas não passam o tempo a cantar... Ópera ou qualquer outra coisa.»
Robert Levine

Acha que não gosta de ópera? Que é uma imensa maçada? Pense melhor... e descubra com Robert Levine o prazer da ópera! Viu O Feitiço da Lua com a Cher e o Nicolas Cage? Então já ouviu La Bohème, de Puccini. (E, se calhar, chorou...)
Comoveu-se com Tom Hanks em Filadélfia? Então conhece La Mamma Morta, de Umberto Giordano, cantada pela Maria Callas. (E, se calhar, chorou...)
 Viu o filme Quarto com Vista sobre a Cidade? Então ouviu O Mio Babbino Caro, de Puccini. (E aposto que regressou a casa a cantarolar...)
 Lembra-se do militar que Robert Duvall interpretou em Apocalypse Now? Lembra-se da cena da praia com os helicópteros? É Wagner. A Cavalgada das Valquírias! (De certeza que se arrepiou.)
 Julia Roberts ficou famosa com Um Sonho de Mulher, a história de uma prostituta e de um cavalheiro, que por ela se apaixona. Baseia-se na história de La Traviata, de Verdi, e ouvem-se partes da ópera ao longo do filme… (Aposto que o fizeram chorar.)
 Lembra-se do Campeonato do Mundo de Futebol de 1990? Possivelmente viu Luciano Pavarotti a cantar Nessun Dorma, de Puccini… (Aposto que estremeceu…)