Figura central de uma história trágica e difícil, Christiane F. tornou-se famosa em todo o mundo como o exemplo da perfeita anti-heroína da vida real. Mas, tal como acontece com todas as histórias reais, os acontecimentos do final de Os Filhos da Droga não foram o final da história. O que aconteceu depois, então? Décadas passadas sobre o sucesso e a fama, este livro revisita Christiane F. para dar voz à sua história depois do livro. E longe, apesar de tudo, de um final feliz, pois raros são os que existem na vida real, o que marcou na primeira fase da história de Christiane continua bem presente neste segundo livro.
Parte do que chama a atenção para este livro resulta do que ficou por dizer no anterior. A conclusão de Os Filhos da Droga é totalmente aberta (mais uma vez, tal como acontece em muitas histórias reais), pelo que fica sempre a curiosidade em saber o que aconteceu depois. E, neste caso, há muito para contar sobre o depois, um futuro que não é nem fácil nem linear, e em que as questões levantadas pelo percurso de Christiane continuam igualmente relevantes.
A questão da dependência, no percurso pautado pelas sucessivas recaídas e recuperações, bem como pelas situações a elas associadas, continua a ser um elemento fulcral sobre o que há a retirar desta biografia. Mas outras questões emergem, desde a fama à intervenção do sistema, passando pela forma como as pessoas em redor de Christiane lidam com a sua presença, sejam amigos, aliados de circunstância ou simplesmente oportunistas. E, neste aspecto, sobressai uma faceta curiosa. Ainda que tudo ou quase tudo o que aqui é contado suceda depois da fama, Christiane F. não lhe atribui assim tanta importância, ou pelo menos não enquanto aspecto central do seu percurso. Os elementos mais relevantes acabam por ser, por isso, os que menos se esperam, o que coloca a sua história sob uma nova perspectiva.
Claro que, mais uma vez, ficam perguntas sem resposta, não só sobre o futuro como sobre certos acontecimentos cuja verdadeira explicação é desconhecida para a própria Christiane. Mas tudo isso é de esperar, tendo em conta que se trata da história de uma vida real, que, por isso, não termina simplesmente com uma frase. Além disso, há alguma divagação na ordem com que os acontecimentos são narrados, o que torna, por vezes, confuso o acompanhamento da linha temporal das situações, mas que, por outro lado, torna mais real o registo de memória, contada ao ritmo da recordação.
É possível que este não seja um livro com o mesmo impacto de Os Filhos da Droga, até porque os tempos - e as reacções - mudaram. Ainda assim, traz respostas que faltavam e o registo de uma nova fase, em que as mesmas - e outras - questões mantêm a relevância e a actualidade. Vale a pena ler, portanto.