Ouvir o nome de Maria Alberta Menéres é, pelo menos para as pessoas da minha idade, pensar em Ulisses, o livro que todos lemos na escola. Mas há evidentemente muito mais para descobrir, e que melhor forma de o fazer do que através de um livro que reúne todo o percurso poético da autora? Todos os livros de poesia publicados, mais alguns textos dispersos, incluindo um ensaio e um muito curioso conto fantástico, o que implica que este extenso volume nos faz chegar ao fim com uma visão bem diferente da evocada pela simples brevidade de Ulisses. Uma visão fascinante, aliás.
Provavelmente o aspecto mais interessante deste volume - além do óbvio interesse da poesia em si, que é belíssima - é que, ao acompanhar a linha cronológica das publicações, é possível captar como que uma evolução no estilo. As imagens vão-se tornando mais complexas, os ritmos mais desenvolvidos, sem nunca perder de vista a estranha e envolvente emotividade que se sente desde os primeiros poemas. É como se, nos primeiros livros, houvesse uma emoção mais à flor da pele, que se vai aprofundando em imagens um pouco mais labirínticas - que implicam criaturas imaginárias e até mesmo referências dignas de ficção científica - mas nunca desaparece. Como que uma visão que vai mergulhando mais fundo, sem nunca perder de vista os sentimentos que lhe servem de base.
E há um sentimento que domina, uma melancolia discreta, quase indescritível, que parece marcar presença em todos os cenários, do que se voltam mais para o interior da alma aos que traçam paisagens impossíveis. É, aliás, isto mesmo que torna tudo tão memorável, porque os sentimentos são próximos, mas as imagens que os envolvem são únicas e peculiares. O resultado são versos memoráveis, expressões que se entranham na memória e a sensação de algo que, embora tão diferente, contém, ainda assim, um bocadinho de nós.
Importa, talvez, olhar um pouco para a forma e destacar dois aspectos. Primeiro, a cadência tão fluida das palavras que, mesmo nas suas construções mais complexas, parece fluir com a máxima naturalidade. E depois, em contraste, o conto, com a sua estrutura tão bizarra e tão complexa que evoca quase um sonho também ele peculiar. Dificilmente poderiam ser mais diferentes, mas parecem reflectir a mesma identidade. Na complexidade das palavras, o conto faz lembrar a poesia - que, por sua vez, flui com a naturalidade de uma história.
Longa e estranha viagem por sentimentos tão vastos, é um mergulho fascinante numa vida inteira de poesia. O tipo de mergulho que, belo nas palavras e nas imagens que nos traça na memória, nos chama a regressar múltiplas vezes. O que dizer então deste grande volume? Que é uma bela obra para se ter à cabeceira. E que é belíssimo, claro.
Título: Poesia Completa
Autora: Maria Alberta Menéres
Origem: Recebido para crítica
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