quinta-feira, 30 de agosto de 2018

O Anjo-da-Guarda (Arto Halonen e Kevin Frasier)

1951. Palle Hardrup entra num banco em Copenhaga com a intenção de realizar um assalto e, quando as suas ordens não são obedecidas, dispara sobre dois funcionários e foge. Não tarda, todavia, a ser detido e o caso parece ter-se resolvido facilmente. Só que não é bem assim. Anders Olsen, responsável pela investigação, cedo começa a achar estranha a atitude plácida do detido e os elementos peculiares não tardam a vir à superfície. Aparentemente, Hardrup estabeleceu, em tempos, uma relação espiritual com um companheiro de prisão chamado Nielsen, a quem deixava que o hipnotizasse. E uma possibilidade começa a ganhar forma: terão os assaltos sido realizados sob a influência de Nielsen? E, se sim, não será este um perigo à solta?
Baseado numa história verídica e com um facto assente desde o início - que há, de facto, influência de Nielsen sobre os actos de Hardrup - , seria de esperar uma certa medida de previsibilidade nesta história. O que surpreende é, então, que essa medida de previsibilidade se cinja precisamente ao facto central: sim, Nielsen é responsável, como sabemos desde as primeiras páginas. Mas como, por que métodos e porquê, além, claro, de como foi que Anders e seus aliados chegaram à prova desses factos... isso já é um caminho de surpresas. Surpresas essas que proporcionam vários momentos intensos, revelações inesperadas... e um final estranhamente adequado.
Também especialmente interessante é a forma como os autores acrescentam ao caso central um conjunto de histórias pessoais e um passado sempre delicado, tendo em conta a data em que o enredo decorre. As relações das várias personagens com os nazis ou a Resistência, as perdas e traições envolvidas e a forma como a ideologia se manifestou em diferentes personagens acrescenta uma perspectiva mais profunda à posição de cada uma delas. E particularmente em Marie e Anders, cuja vida pessoal enquanto casal é particularmente abalada por este caso, sendo eles - mais até do que Nielsen - o verdadeiro núcleo central desta história.
Ficam algumas questões em aberto, principalmente no que toca à relação entre Anders e Marie, e daí uma certa curiosidade insatisfeita sobre a superação - ou não - do abismo que o caso abriu entre ambos. Ainda assim, faz também um certo sentido que assim seja, já que a linha central da história é o caso Hardrup e esse atinge uma completa conclusão. Além disso, fechar a história num ponto entre a divisão e a esperança deixa também uma agradável aura de mistério que, tendo em conta a forte presença da hipnose em todos os acontecimentos, resulta também bastante adequada.
Nem sempre o mistério sobre a identidade do culpado é essencial a uma boa história policial. Neste caso, sabê-la de antemão só torna tudo mais intenso. E assim, a impressão que fica é a de uma leitura com uma premissa previsível, mas imprevisível em tudo o resto. E, por isso mesmo, muito cativante. 

Autores: Arto Halonen e Kevin Frasier
Origem: Recebido para crítica

Sem comentários:

Enviar um comentário