A vida é feita, muitas vezes, de expetativas, e é com base nelas que construímos as nossas vidas. Até ao dia em que o que parecia ser a escolha de uma vida deixa de ser assim tão agradável. Esta é a história de um fotógrafo que, cansado da vida que construiu, decide deixar tudo para trás e tentar descobrir o que realmente quer e quem realmente é. Só que esse caminho não é tão fácil como parece. Até o amor mais incondicional do mundo tem os seus limites na inevitabilidade da morte. E as novas relações que vão surgindo também não são imaculadas - todos carregam sobre os ombros a sombra de um passado e das suas consequências. E a vida vai passando... e as coisas vão mudando... e a busca da identidade começa a revelar menos certezas e mais ambiguidades.
Parte da beleza deste livro está na forma como, partindo de uma história muito pessoal e singular, transmite situações e pensamentos com que qualquer leitor facilmente se poderá identificar. Escolhemos uma profissão, mas a vida leva-nos por outros rumos. Esperamos construir relações, mas nunca conhecemos realmente ninguém. Julgamos que alguém é uma boa pessoa, ou que determinadas escolhas fazem com que seja impossível sê-lo, mas há mais vida para além dessa escolha. Idolatramos a obra de alguém, mas o criador é tudo menos perfeito. E somos... somos o que somos, apesar de tudo isto. Tal como o protagonista deste livro.
Outra das grandes forças desta história, e da forma como está construída, é a forma como vive das pequenas coisas. Não é propriamente um livro que viva de grandes dramas, pois até as inevitáveis perdas assumem o seu lugar na inevitabilidade do percurso. Mas dá alma e emoção até aos mais pequenos momentos, do primeiro encontro com alguém à aceitação das suas falhas. E, ao longo de todo este percurso, há todo um leque de emoções, da ternura ao humor, da nostalgia à revolta, da angústia à esperança. A angústia acaba, aliás, por ser quase uma personagem, e uma personagem que nos aproxima inesperadamente da história.
Visualmente falando, fica, mais do que uma impressão específica, a sensação de que repercute na mente a pegada emocional das personagens. Os rasgos vermelhos da angústia, o azul da melancolia, as expressões contemplativas da perda que se reflete nas personagens... é como se as emoções falassem através dos traços. E, numa história que vive tanto do interior das personagens como do seu exterior quotidiano, este retrato visual das emoções é particularmente importante.
Um combate quotidiano... é disso que se trata, de facto. Contra a angústia, contra a tristeza, contra a desorientação, contra o que nos faz sentir menos vivos enquanto o estamos. E um combate que todos conhecemos de alguma forma. É essa, no fundo, a verdadeira marca desta história em que não somos o protagonista, mas entendemo-lo. Ou o que ele reflete de nós.
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