John Cleaver matou um demónio. Para o fazer, teve de recorrer à sua personalidade secreta, ao sociopata com tendências de serial killer que tem dentro de si e que tem tentado conter com inúmeras regras e imposições. Mas, pela primeira vez, o Senhor Monstro obteve o que queria, e, agora que matou pela primeira vez, é muito mais difícil de controlar. Cada dia é uma luta contra os pesadelos e as vontades que se insinuam na mente de John. E a situação só piora quando cadáveres de mulheres torturadas começam a aparecer em Clayton. Há um novo assassino à solta... mas será, pelo menos, humano?
Parte do estranho fascínio deste livro resulta da conjugação entre uma situação com muito de sombrio e uma inesperada leveza na forma como a história é narrada. Há um serial killer à solta e o próprio protagonista é um sociopata, mas a história é contada de forma envolvente, agradável de ler, mesmo nos momentos mais arrepiantes, e com um curioso toque de humor negro a quebrar os momentos de maior tensão. É, também, bastante surpreendente em muitos aspectos.
John, narrador e protagonista, é uma personagem inesperadamente heróica, para sociopata. Apesar do mundo tenebroso dos seus pensamentos e vontades, a verdade é que o seu lado negro está quase sempre controlado e a maioria das suas acções têm, afinal, as motivações certas. Há excepções, claro, e uma destas representa um momento particularmente perturbador da história, mas são também estas fraquezas que conferem realismo à sua luta. Apesar dos impulsos do Senhor Monstro, John consegue quase sempre fazer o que está certo e isso é particularmente relevante tendo em conta os acontecimentos deste segundo volume.
Tendo em conta a conclusão do primeiro volume, é de esperar que também aqui surja algum elemento sobrenatural. E assim acontece, de facto. Se, a princípio, a história se centra essencialmente nos problemas de John em lidar consigo mesmo - ou com as necessidades da sua metade obscura - , também as respostas que ficaram por dar no passado acabam por ressurgir, sob a forma de um novo inimigo. Mais uma vez, o adversário de John é uma criatura sobrenatural, com as suas relações com os acontecimentos anteriores e o inesperado da sua identidade a abrir portas para uma série de acontecimentos intensos e surpreendentes. A fase final é, aliás, simplesmente viciante, com o desespero das circunstâncias e o quase duelo entre a estranha mente de John e as capacidades do seu rival a determinar a salvação ou a condenação de mais vidas que simplesmente as dos dois opositores.
Importa referir, por último, que, ainda que a história se centre essencialmente em John e nas suas lutas (interiores e não só), há também um desenvolvimento interessante a nível da sua família, com Lauren a desempenhar um papel muito importante para a história e a servir de base a uma bem conseguida abordagem às questões relativas à violência doméstica.
Intenso e viciante, com o seu lado sombrio e perturbador em perfeito equilíbrio com a leveza da narrativa e um protagonista que, apesar de problemático em muitos aspectos, parece ter o coração no sítio certo, Senhor Monstro continua de forma igualmente intensa e cativante a história iniciada em Não Sou um Serial Killer, deixando em aberto muitas possibilidades para a conclusão desta série. Muito bom.
Sem comentários:
Enviar um comentário