Ficou para a história como "o papa de Hitler" pelo seu silêncio prolongado relativamente às atrocidades cometidas pelo regime nazi. Mas a história nunca é assim tão linear e se, na sua vida pública, Pio XII manteve, de facto, o silêncio durante a guerra, com excepção de alguns vagos protestos, já a acção clandestina foi bastante mais ampla. Em contacto com elementos da resistência alemã, terá desempenhado o papel de mediador para a paz, estando inclusive a par de várias tentativas de eliminar Hitler. E é desses contactos e das conspirações subjacentes que trata este livro.
Debruçando-se sobre um tema complexo e explorando-o através da história dos seus vários intervenientes, este é um livro que é também, inevitavelmente, complexo e, assim sendo, exige tempo e concentração intensa para assimilar todos os pormenores apresentados. Mas é também uma leitura cativantes, pois, acompanhando o percurso dos diversos intervenientes, adquire quase que a estrutura de um romance (ainda que de um romance particularmente descritivo). Claro que a vasta teia de intrigas que é traçada neste livro, bem como a complexidade do próprio contexto, exigem um amplo conjunto de nomes, datas e informações que requerem bastante atenção para assimilar. Ainda assim, a leitura nunca se torna demasiado pesada, o que, num livro como este, é sempre, à partida, um ponto forte.
Outro aspecto que pode despertar sentimentos ambíguos é o facto de o foco estar essencialmente sobre o Vaticano e a resistência Alemã, deixando para segundo plano (ainda que o essencial seja, de facto referido) as movimentações dos Aliados e também dos outros países do Eixo. Sobre estes, fica por isso a impressão de que mais haveria a dizer. Por outro lado, também é certo que muitas outras obras há sobre este tema e que, ao centrar-se, acima de tudo, nas relações entre Pio XII e a chamada Alemanha Decente, torna-se mais fácil a percepção do secretismo destas ligações e da importância do que estava em jogo.
Ainda um outro ponto que importa referir, e provavelmente o mais impressionante neste livro, é a capacidade do autor de apresentar tanta informação pertinente, tantos pormenores, ao mesmo tempo que nos conta uma história que, por vezes, quase se torna pessoal. A figura de Müller, com o seu tão importante papel na conjura, torna-se tão fascinante à luz daquilo que sobre ele é dito que quase se sente a tensão, o perigo, a agonia das suas circunstâncias.
É isso, no fim, que fica na memória: a capacidade do autor de lembrar a quem o lê que estes factos são mais do que estatísticas no relato de uma guerra. São vidas, são pessoas, com princípios e valores. E a forma como o autor descreve tudo isto, realçando a humanidade dos intervenientes e o valor da causa sem perder de vista a realidade pura e dura é mais do que suficiente para fazer com que este livro valha a pena.
Esclarecedor, bem estruturado e muitíssimo interessante, trata-se, pois, de um livro com muito para revelar. Não, não é uma leitura compulsiva. Mas vale cada momento que lhe seja dedicado.
Título: Os Espiões do Papa
Autor: Mark Riebling
Origem: Recebido para crítica
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