Há muito tempo que sabe ser diferente e, por isso, vive uma vida bastante isolada. Mas também muito calma. Tendo como única amiga a velha vizinha, ele passa os dias a deambular, visitando os jardins para dar de comer ao gato que por lá anda e observando um mundo em que a normalidade é um fardo. Em tempos, chamaram-lhe anormal e esse peso ficou com ele a vida inteira. Mas eis que algo lhe desperta a curiosidade: uma mulher que parece ter uma vida perfeita e que, porém, é intensamente infeliz. Sente-se atraído pelo que julga ter em comum com ela. Mas não sabe que será essa mulher o seu ponto de viragem, rumo a uma verdade impossível de ignorar.
Não é muito fácil falar sobre este livro sem revelar demasiado da história, até porque o final lança uma nova luz sobre todos os acontecimentos anteriores. Mas o impacto desta revelação final já diz muito sobre o livro: uma história com bastante de estranheza e o que parecem ser algumas pequenas incongruências, que ganham um novo sentido com o desvendar da verdade. História de um homem que se sente diferente, que se sabe diferente, e que, através dessa mesma diferença, lança todo um novo olhar sobre a normalidade.
Narrado na primeira pessoa e centrado no que distancia o protagonista do resto do mundo, é um livro em que domina a introspecção. Mas é interessante notar que, apesar deste mergulho nas profundezas do pensamento do protagonista (com o qual é fácil, por vezes, concordar, e noutras discordar), o ritmo da narrativa nunca se torna demasiado denso. Há um mistério em torno do protagonista, bem como da mulher que ele tanto observa. E esse mistério mantém sempre viva a vontade de saber mais, de descobrir a verdade, de questionar as verdadeiras raízes da diferença. E essas, quando reveladas, mas também quando apenas insinuadas, despertam sentimentos bastante impressionantes.
Com pouco mais de 140 páginas, é um livro bastante breve. Mas, se tivermos em conta a história e a forma como tudo se desenrola, entrelaçando em medidas iguais pensamentos e acontecimentos, a verdade é que tudo parece ter a medida certa. E este equilíbrio torna-se ainda mais importante se se tiver em conta que grande parte do enredo se tece na fina linha que separa a realidade da alucinação.
A soma de tudo isto é, claro, uma muito boa surpresa. Um livro que se lê rapidamente, mas que se entranha na memória bem depois de terminada a leitura, e que, no seu olhar sobre a diferença, questiona o próprio conceito da normalidade que rege (ou não) a vida de cada um. Muito interessante, muito bonito... e muito bom.
Título: Todos Iguais, Poucos Diferentes
Autora: Morais de Carvalho
Origem: Recebido para crítica
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