Parece existir na sociedade de hoje um certo imperativo de perfeição mental e emocional, que passa, entre outras coisas, pela modéstia (ainda que falsa), pelo dar-se bem com e agradar a toda a gente, por uma boa medida de culpabilização e auto-castigo e por uma competitividade a todo o custo que obriga também a uma felicidade sem tréguas. Mas há uma pequena falha nesta lista de exigências: é que isso da perfeição é impossível. E, ao tentar atingi-la custe o que custar, o resultado pode muito bem ser uma sensação de fracasso, de inutilidade, de inadequação. Como ultrapassar isso, então? Simples - abraçando a imperfeição e aprendendo a viver de uma forma mais equilibrada, questionando as premissas do perfeccionismo e encontrando no interior de cada um as verdadeiras raízes da felicidade. É esta, muito resumidamente, a base deste livro. E a imagem que fica, depois de lido, é, sem dúvida alguma, muito positiva.
Um dos aspectos que, desde logo, cativam neste livro é o facto de, contrariamente a muitos livros de auto-ajuda, não apresentar uma teoria em que, lido, tudo parece fácil. Não é assim. O que autor apresenta é um conjunto de ideias que, postas em prática, não nos colocam perante uma felicidade absoluta e constante - até porque isso não existe - mas perante uma forma de estar mais positiva, mais benéfica. E isso, sim, talvez possa trazer a felicidade para mais perto. Além disso, a forma como o autor analisa os vários problemas, maioritariamente relacionados com expectativas sociais, marca pela análise particularmente certeira. Se olharmos para a sociedade de hoje, é fácil identificar alguns desses problemas. E quanto às soluções apresentadas... bem, aí sobressai o facto de não haver uma solução perfeita, mas antes uma caminhada que tem em conta os traços pessoais de cada um e as várias formas de os potenciar de uma forma mais positiva.
Ainda um outro aspecto que importa realçar é a forma como o livro está construído: primeiro, a divisão nas dez premissas libertadoras, cada uma delas associadas a um problema específico do perfeccionismo social excessivo. Isto realça as peculiaridades de cada um destes problemas e das respectivas soluções, facilitando ao leitor a possibilidade de consultar as que considerar mais úteis. Além disso, o recurso a vários relatos e casos particulares, que demonstram a aplicação prática das ideias que vão sendo apresentadas ao longo do texto, tornando-as assim mais claras e também mais fáceis de assimilar.
E, por último, ainda relativamente à questão das teorias e das suas repercussões práticas, uma nota para o facto de, não sendo um método rígido nem uma teoria de regras estritas, o conjunto de ideias que o autor aqui apresenta deixar espaço para as interpretações e aplicações que cada um achar mais adequadas. Porque, no fundo, a essência deste livro é muito simples: liberdade na imperfeição. E, assim sendo, as premissas podem ser muito claras, mas pô-las em prática cabe apenas a quem as lê.
Não é propriamente um guia em dez passos para a felicidade - até porque, se o fosse, não seria muito realista - mas antes uma aproximação ao perfeccionismo excessivo imposto pela sociedade e às possíveis formas de o ultrapassar. E, tratando a imperfeição mais como um facto e menos como um defeito, este livro permite uma abordagem mais lúcida e mais realista à vida e à realização pessoal. Não há soluções perfeitas, tal como não há pessoas perfeitas. E é o muito de bom que o autor constrói a partir deste facto que torna esta leitura memorável. Recomendo.
Título: Maravilhosamente Imperfeito, Escandalosamente Feliz
Autor: Walter Riso
Origem: Recebido para crítica
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