Agora que a guerra acabou, Felix tem esperança de que o mundo comece a tornar-se um local mais seguro, mas não é isso que está a acontecer. Entre a escassez e a destruição, há quem esteja disposto a tudo para sobreviver mais um dia, e por isso Felix e Gabriek têm de ter muito cuidado de cada vez que saem do seu esconderijo. Mas é numa dessas saídas que o caminho de Felix se cruza com o de Anya, uma rapariga intrépida e implacável com quem acaba por criar uma estranha amizade. E é também numa dessas perigosas saídas que Felix se vê com uma nova vida nas mãos - e muitos sarilhos pela frente.
Ainda que possam ser lidos de forma independente, há algo de particularmente notável a sobressair destas histórias e que é mais evidente se forem lidas por ordem cronológica. Falo do crescimento de Felix, e do contraste com a sua sempre tocante inocência. Felix perdeu muitas das pessoas que amava, viu caos, morte e guerra para durar várias vidas e, ainda assim, continua a querer ser a melhor pessoa possível, fazer sempre o que está certo e ajudar as pessoas quando em dificuldades. Ora, escusado será dizer que, no seu mundo, isso significa problemas e é algo de impressionante a coragem e o afecto com que este jovem protagonista encara cada situação.
Outro aspecto particularmente notável nestes livros, e neste em particular, é que, embora seja um livro juvenil, não foge de todo aos temas difíceis. Tendo em conta o momento em que decorre, é difícil fugir à guerra e à morte, e o autor não tenta evitar estas questões. A sombra da perda é uma presença constante, que, além de tornar todo o percurso mais realista, está na origem de alguns dos momentos mais avassaladores do enredo. E também aqui a inocência de Felix entra em jogo, pois, sendo ele o narrador, o impacto emocional ganha uma clareza mais intensa, deixando para trás uma marca mais poderosa e a certeza de que o sofrimento deixa marcas - sobretudo nos inocentes.
E importa ainda voltar a Felix e à forma como ele conta a história. É dada ao protagonista a voz da inocência dos seus treze anos, mas também uma mente perspicaz e rápida. E, assim, a história é-nos contada de forma simples e directa, ainda que com espaço para grandes laivos de emoção e algumas frases simplesmente brilhantes, mas também com um notável contraste entre as necessidades da luta pela sobrevivência e a inocência e bondade interiores que Felix se esforça por manter.
Inocente na perspectiva, mas implacável na visão dos horrores da guerra, trata-se, pois, de um livro que, apesar de juvenil, é bem capaz de deixar a sua marca em leitores de qualquer idade. Cativante, comovente, cheio de surpresas e de emoção, um livro que supera em tudo as expectativas geradas pelos volumes anteriores. Memorável, em suma.
Título: Em Breve
Autor: Morris Gleitzman
Origem: Recebido para crítica
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