sábado, 25 de abril de 2020

O Prazer da Leitura (Marcel Proust)

A leitura pode ser muitas coisas: escapismo, abstracção, fonte de aprendizagem, base para reflexão, manancial de conhecimento, inspiração e companhia, entre muitas outras coisas. E é, naturalmente, um prazer. Mas ver o prazer da leitura, e sobretudo da leitura dos clássicos, pela pena de um autor que é, ele mesmo, clássico acrescenta complexidade e profundidade a esta ponderação. E o que é, afinal, um prazer muito simples torna-se denso e complexo, ressoando de formas inesperadas.
Algo que importa referir, à partida, sobre este livro é que parece ter sido pensado como prefácio a uma outra obra. Não surpreendem por isso as muitas referências que surgem ao longo do texto, tal como não surpreende a relativa brevidade. Surpreende, sim, que num livro tão curto sejam tão complexos e elaborados os pontos de vista, tão detalhadas as descrições e tantas as citações e autores referidos. E, sendo certo que a leitura adquire um registo bastante pausado, também o é que não faltam as frases memoráveis, bem como a visão global de que o prazer da leitura como um todo pode ser algo de muito mais vasto do que a simples experiência pessoal.
Há também um contraste entre as diferentes etapas abordadas no livro, com um ênfase especial dado às leituras da infância e à forma como, mais do que a memória dos livros, fica a memória do que se passava quando os estávamos a ler. É este o aspecto mais marcante deste texto. Afinal, já nos aconteceu a todos associar um determinado livro a um certo acontecimento que sucedeu quando o estávamos a ler, certo? E não apenas na infância. Mas há um outro aspecto a enfatizar desta parte: é que é a mais pessoal de todo o texto, bem como a mais fluida. E, por isso, também a que mais nitidamente fica na memória.
Quanto aos muitos autores e citações apresentadas, poderá tratar-se de um factor difícil de acompanhar caso não se conheça muito bem o seu percurso. É que, além dos nomes propriamente ditos, muitas das citações surgem em francês ou latim - o que exige alguma pesquisa para descobrir o seu significado. O resultado é como que um contraste vincado entre uma primeira parte de grande proximidade e uma que se afasta para fontes mais longínquas - tendo, ainda assim, como elo comum a leitura nas suas múltiplas vertentes.
Eis, pois, um livro que, sob a sua aparente brevidade, esconde uma surpreendente e complexa vastidão. E, por isso, um livro surpreendentemente exigente, mas particularmente interessante na sua abordagem ao prazer da leitura.

Autor: Marcel Proust
Origem: Aquisição pessoal

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