Katia é a filha mais velha de um casal de emigrantes espanhóis que decidiu esquecer o passado e construir uma nova vida na Berlim Oriental. Nunca conheceu outra vida, pelo que tudo lhe parece relativamente normal. Mas, pouco a pouco, Katia vai crescendo, notando as pequenas estranhezas da sua vida familiar. E, um dia, o seu olhar pousa num homem que pertence claramente ao outro lado e com quem sabe que não deve estabelecer contacto... mas não consegue evitar. Quase sem dar por isso, Katia tornou-se mulher e está agora a descobrir o amor. Mas amar Johannes significa deixar para trás a sua família e passar também para o outro lado - independentemente das consequências que isso possa ter...
Provavelmente o aspecto mais marcante deste romance é a capacidade de abranger, nas suas cerca de cento e trinta páginas, uma história pessoal, um entrelaçado de relações familiares e também uma visão bastante precisa, ainda que deliberadamente limitada pela perspectiva da protagonista, do contexto político em que decorre. A história é, acima de tudo, pessoal, mas o contexto político assume um papel de relevo, não só devido às origens da família, mas também ao peso que atribui às derradeiras revelações.
Outro aspecto particularmente bem conseguido é a forma como o próprio registo vai acompanhando o crescimento da protagonista. A pequena Katia dos primeiros capítulos compreende muito menos do que a rodeia do que a Katia das últimas páginas, o que é bastante evidente na voz que a autora lhe confere. Tem também uma cadência peculiar que parece reflectir o ritmo dos pensamentos de Katia, incluindo frases aparentemente incompletas - ou premeditamente inacabadas - que espelham na perfeição o profundo caos mental que, às vezes, se apodera da protagonista.
Claro que esta perspectiva pessoal implica, por vezes, algumas questões aparentemente deixadas em aberto. O passado dos pais de Katia é maioritariamente deixado na penumbra e mesmo o que acontece depois da sua partida é visto de forma algo parcial - ainda que haja efectivamente umas quantas revelações poderosas à espera no final. Fica, ainda assim, uma curiosa impressão: a de que, embora fique uma certa curiosidade insatisfeita sobre estas outras personagens, esta ausência de respostas faz todo o sentido... pois também Katia não as tem.
Breve, mas surpreendentemente complexo. Pessoal, mas curiosamente preciso na construção do contexto em que as personagens se movem. Soturno, mas com rasgos de profunda emotividade. Assim é este romance de crescimento e de perda, feito das medidas certas de amor e de introspecção. Breve, sim, mas memorável. E uma boa leitura, sem dúvida.
Título: A Filha do Comunista
Autora: Aroa Moreno Durán
Origem: Recebido para crítica
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