Sylvie tem um estranho dom. Sempre que toca num objecto, sente o seu passado, a sua história. Os seus fantasmas, ainda que nunca lhes dê esse nome. E, ao entrar na vida de George, tudo muda. George não sente que pertença ao seu próprio corpo, o que a transformou num alvo para os rufias. Quando Sylvie o salva deles, forma-se uma ligação entre os dois. Mas o tempo passa, a vida muda e Sylvie começa a ver o seu dom como um problema. Começa a abrir-se um fosso entre Sylvie e George... e todas as sombras começam a vir à tona. Pois, se Sylvie abandonar os seus fantasmas, então estes vão precisar de encontrar outro alguém para os ouvir. Alguém que, como eles, não pareça pertencer ali.
Parte do que torna este livro tão fascinante é o facto de, apesar da sua relativa brevidade, conter uma tal profundidade de emoção e de tristeza que é impossível não sentir com as personagens. Sylvie tem um tipo singular de tristeza, suportada com graça e serenidade e canalizada para a sua amizade com George. A tristeza de George é mais profunda e destrutiva, e tão presente, tão intensa que quase é possível tocar-lhe. Existe, além disso, algo de intemporal nesta história de amizade e anseio. O tempo passa para todos e o que em tempos pareceu ser para sempre desaparece sem deixar rasto. Sylvie e George crescem e constroem novas vidas para si mesmos. E aquele laço que havia entre eles, essa amizade feita de tristeza e de compreensão, traça um caminho diferente para cada um.
Existe também ao longo de toda a história uma escuridão que é quase tangível, não só devido aos fantasmas ou à relação que George tem com as lâminas, mas sobretudo devido à percepção generalizada de que cada vida contém a sua própria escuridão. A "ferida que nunca sara pois não é do corpo" é, por vezes, a própria vida e, ao vê-la nesta história, reconhecemo-la no mundo real. Pode ser uma história breve, mas capta com mestria as mais negras sombras da vida normal. E isso é, em si, algo de belo.
Às vezes, uma história não precisa de ser longa para deixar a sua marca naqueles que a lêem. É o caso deste livro: uma breve e fascinante história de amizade e de tristeza, de crescimento e de trevas, de vida... para além da vida.
Título: The Attic Tragedy
Autor: J. Ashley-Smith
Origem: Recebido para crítica
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