A cada noventa anos, doze jovens são escolhidos para se tornarem deuses. Durante dois anos, serão como celebridades, amados e odiados por aquilo em que se tornaram. Depois morrerão. Mas há um outro lado sombrio para este ressurgir de um panteão divino. Laura Wilson, anteriormente uma fã, revelou ser uma décima terceira deusa, destinada a provocar a destruição. E Ananke, guia e mentora do panteão, esconde os seus próprios planos sinistros. Laura - ou Perséfone - devia estar morta, mas não está. E, à medida que as verdades vêm à tona, as divisões aprofundam-se. O resultado só pode ser um: a guerra entre os deuses. E o fim das movimentações secretas de Ananke.
Sendo o volume mais intenso de uma série toda ela cheia de surpresas e de tensões, este é um livro em que o movimento e as grandes cenas de acção assumem um papel fundamental. E há dois aspectos que sobressaem relativamente a este ponto. Primeiro, o impacto visual das grandes cenas, cheias de pequenos pormenores e, ao mesmo tempo, de um caos meticulosamente organizado (sobre o qual é possível descobrir ainda um pouco mais através do material suplementar que surge no fim do livro). Segundo, o contraste entre estes grandes momentos de conflito e as súbitas pausas resultantes do caos interior de Laura. Perséfone esteve no inferno e isso nota-se. E há como que uma melancolia profunda nas suas expressões que contrasta vivamente com os rasgos de fúria e que é transposta para o cenário global como uma espécie de calma por entre as tempestades.
Outro aspecto a destacar é o adensar da escuridão que envolve esta história. Desde muito cedo que há segredos e intrigas na sombra da aparentemente exuberante vida dos novos deuses, mas cada desenvolvimento trouxe consigo mais sombras, mais conflitos e mais crueldade. Agora, a guerra tornou-se aberta e os segredos começam a ser revelados a todos. O resultado é uma evolução em que as sombras se vão sobrepondo ao brilho da vida de celebridade, em que o perverso começa a sobrepor-se ao divino e em que cada conflito e cada morte traz consigo consequências surpreendentes.
E há ainda o ponto mais impressionante numa história que é toda ela impressionante: a capacidade de conjugar ambiguidade moral com uma empatia intensa e profunda. Laura é o máximo exemplo disso, principalmente na fase final deste volume, mas é algo que se aplica, de forma mais ou menos clara, a quase todas as personagens. Neste mundo, divino não significa necessariamente bom e não faltam violência e crueldade a lembrar que a guerra destes deuses só é diferente da dos homens em termos de meios e de dimensão. E, ainda assim, há proximidade: com Perséfone, no que a levou ao inferno; com Minerva, na sua sábia inocência; com a tripla mente perturbada de Morrigan... com a omnipresença de um engano cujas consequências se revelam agora em toda a sua verdadeira dimensão. Nenhuma das personagens desta história é sempre linearmente bondosa. Todas têm o seu contraste de luz e sombra - e é precisamente isso que as torna tão brilhantes.
Intenso no seu equilíbrio de empatia e crueldade, fascinante no contraste entre a quietude das sombras interiores e o movimento dos grandes conflitos, visualmente belíssimo, tanto na expressividade dos rostos como nas sequências de acção, trata-se, pois, de um livro que consegue elevar ainda mais as altíssimas expectativas que cada novo volume desperta. E talvez possa resumir-se a uma palavra: glorioso.
Título: The Wicked + The Divine: Escalada
Autores: Kieron Gillen, Jamie McKelvie, Matt Wilson e Clayton Cowles
Origem: Recebido para crítica
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