domingo, 10 de março de 2013

Tormento (Rafael Bernardes)

Um olhar às sombras do mundo e da existência individual, num conjunto de poemas pessoais e introspectivos, mas evocando também um ambiente um pouco sombrio e com laivos de surreal. Assim é este pequeno livro, onde as imagens evocadas por cada poema se conjugam com um interessante conjunto de ilustrações. O resultado é uma edição bastante bonita e uma leitura cativante, já que, se as emoções expressas nos poemas são bastante pessoais, não deixam, por isso, de ter algo de comum e de familiar, evocando estados de espírito fáceis de reconhecer.
Construídos numa estrutura relativamente livre, apesar do recurso à rima, os poemas deste livro parecem definir-se por um ritmo particular, sem elos comuns a nível de métrica, mas deixando a impressão de que as imagens fluem ao ritmo do pensamento. Há, por isso, bastantes diferenças na construção dos poemas, sendo alguns relativamente extensos, enquanto que, noutros, sobressai a brevidade, havendo inclusive alguns que se aproximam um pouco da prosa. Em comum, têm o contraste entre a expressão bastante directa dos sentimentos e as imagens mais sombrias e elaboradas dos ambientes.
Apesar deste ritmo bastante livre, a utilização da rima na quase totalidade dos poemas parece impor algumas limitações, não propriamente a nível de fluidez do texto, mas na impressão de que algumas ideias poderiam ter sido mais desenvolvidas. Isto aplica-se principalmente à tal expressão de sentimentos, que parece, por vezes, demasiado simplificada. Ainda assim, o inesperado dos ambientes  complementa essa simplicidade, tornando os poemas mais interessantes e um pouco mais complexos.
Este curioso equilíbrio é ainda reforçado pelas ilustrações, que, também evocando cenários bastante sombrios e algo surreais, reflectem e expandem o imaginário dos poemas, contribuindo, ao mesmo tempo, para tornar mais interessante o aspecto visual do livro. A imagem adequa-se aos poemas, mas não se limita às ideias que estes apresentam. Poemas e ilustrações apresentam, assim, ambientes que se completam e se expandem mutuamente, resultando num todo maior e mais cativante que cada uma das partes considerada individualmente.
Conjugando uma expressão pessoal de sentimentos com um ambiente sombrio e peculiar, fica, deste conjunto de poemas, a impressão de uma unidade sólida e de leitura cativante, em que comum e surreal se equilibram nas medidas certas, para um todo interessante e, mesmo nos momentos em que mais haveria a dizer, bastante bem conseguido. Gostei, portanto.

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