quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Deuses Americanos - O Momento da Tempestade (Neil Gaiman, P. Craig Russell e Scott Hampton)

O Pai Supremo foi morto pelos novos deuses, o que significa que a guerra é agora inevitável. E é com esta certeza que, com alguns companheiros relutantes, Shadow parte para o centro da América, a fim de, à sombra de uma trégua, recuperarem o corpo de Wednesday. Só que nada do que Shadow julgava saber é verdadeiro e, face a uma longa e potencialmente mortal vigília ao corpo do seu líder morto, muitas verdades virão à superfície. Mais do que uma guerra, avizinha-se um massacre. E só Shadow poderá dar voz à verdade... se sobreviver à sua descoberta.
Terceiro e último volume desta adaptação do romance de Neil Gaiman, um dos primeiros aspectos a sobressair deste livro é a ainda mais irresistível vontade de ler o original que lhe serviu de base. O que não quer dizer que seja necessário, pois estes três volumes valem pela sua própria natureza, proporcionando uma experiência tão peculiar quanto fascinante, e também repleta de intensidade e emoção. Ainda assim, é impossível não querer reencontrá-la noutro formato.
Outro aspecto notável é o simples facto - bem, ou talvez não assim tão simples - de que toda esta viagem tem sido uma sucessão de enigmas e de ilusões criadas pelos diferentes intervenientes. Sendo o último volume, é aqui que todas as revelações se manifestam. Mas, se o mistério já vinha de trás, o que talvez anunciasse já uma certa turbulência, nada poderia ter prenunciado a tempestade de revelações que é este livro. Nada nem ninguém era o que julgávamos ser. E a forma como isso se manifesta - sobretudo no impacto que tem para Shadow - é algo de absolutamente genial.
Mas o mais impressionante de tudo é a capacidade de despertar emoções tão profundas e uma familiaridade tão grande num mundo que é, afinal, tão peculiar. Deuses, antigos e novos, uma sucessão de fenómenos estranhos e uma vigília tão brutal no aspecto físico quanto mística no aspecto onírico, dão a todo o percurso um ambiente improvável. E, ainda assim, é absurdamente fácil compreender a desolação de Shadow, as mágoas, a perda, a sensação de traição, o sacrifício, a determinação... enfim, toda uma natureza humana complexa e vulnerável, mas com o coração e os valores no sítio certo. O que é em si mesmo um prodígio, numa história como esta.
Intenso, belíssimo e emocionalmente devastador, eis, pois, um final notável para esta tão estranha viagem. Uma viagem pela América - e por outros mundos que não este - mas, sobretudo, pelo coração das personagens. Porque, parafraseando uma delas, há sangue, mas também há gratidão. E o inverno foi longo... Mas fascinante, acima de tudo.

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