domingo, 4 de novembro de 2012

Predestinados (Josephine Angelini)

Helena passou a vida a esforçar-se para ficar longe das atenções dos que a rodeiam. Nunca quis ser a melhor em nada, mesmo sabendo que podia facilmente fazê-lo, por temer que isso revelasse as suas diferenças e, por isso, nunca foi propriamente popular. Mas as suas tentativas de se manter discreta terminam abruptamente quando Lucas Delos chega à escola e Helena se descobre com uma vontade incontrolável de o matar. Com ela chegam as visões de três estranhas figuras e o despertar de poderes que, no fundo, sempre soube que tinha. E ainda a descoberta de que não é completamente humana, mas antes descendente dos deuses e, por isso, elemento de uma guerra entre Casas que perdura há milhares de anos. Tudo começa com um ódio irracional por Lucas... mas os verdadeiros problemas surgem quando esse ódio dá lugar a algo bem diferente.
Envolvente e com uma escrita acessível e agradável, este livro tem na caracterização do sistema o seu ponto de maior interesse. As ligações à guerra de Tróia e consequente reconstrução de uma guerra entre diferentes semideuses servem de base para toda uma vastidão de poderes e para um sistema de Casas que, não sendo exaustivamente desenvolvido, revela, ainda assim, bastante de interessante. Além disso, o papel das Fúrias na história dá à fase inicial e mais previsível da história um surpreendente toque sombrio, o que contribui também para que a leitura se mantenha cativante.
Há bastante a acontecer neste livro e muitas reviravoltas ao longo do enredo. E, ainda que a história se centre na relação entre Helena e Lucas, há um conflito a decorrer para lá deles (e, em parte, devido a eles). Isto leva a que outras personagens, e algumas delas simplesmente humanas, tenham um papel importante a desempenhar na história, sendo, por vezes, essas figuras aparentemente secundárias o centro de alguns dos momentos mais marcantes do enredo. Importa ainda o facto de os verdadeiros contornos do conflito - e as regras e crenças a ele associadas - serem revelados de forma gradual, apresentando sempre novos problemas quando o anterior parece aproximar-se da resolução. Isto faz com que os pontos de mudança, quer na situação global, quer no percurso pessoal de Helena e Lucas, despertem novos momentos de acção e conflito, definindo um ritmo intenso, ainda que com algumas soluções algo apressadas para partes da história.
Também no que diz respeito à caracterização de personagens, há figuras secundárias que acabam por se destacar tanto ou mais que os protagonistas. É o caso de Noel, com a sua presença discreta, mas de autoridade inegável, ou dos amigos humanos de Helena. Quanto aos protagonistas, têm algumas boas características e a forma como reagem a algumas situações cria vários momentos cativantes, mas têm também alguns pontos fracos. Lucas numa tendência dominante algo excessiva, Helena na forma como ora defende impetuosamente as suas ideias, ora renuncia a elas por simples insegurança, ambos na forma como criam mal-entendidos por simples falta de vontade de falar um com o outro. Isto cria algumas situações de estranheza, ainda que algumas dessas características façam sentido no contexto dos seus papéis no enredo, mas põe também em destaque as suas qualidades, quando se revelam em oposição aos defeitos.
No meio de tudo isto, acaba por ser o romance o que menos marca, já que, entre a facilidade com que uma guerra com os deuses pode ser desencadeada, as intrigas e segredos familiares (num contexto de família bastante diferente do normal) e a simples necessidade da protagonista de assimilar as regras do mundo de que faz parte, a parte romântica acaba por parecer, por vezes, o menor dos problemas dos protagonistas. Há momentos intensos, é certo, e inclusive uma leve tendência para a obsessão na relação entre ambos, mas acabam por ser apenas um ponto numa história de decisões mais importantes.
Não sendo particularmente complexo, e apesar de alguns momentos mais bruscos e das várias perguntas ainda sem resposta, Predestinados apresenta, ainda assim, uma história leve e envolvente, com vários bons momentos e uma interessante reconstrução de alguns aspectos da mitologia. Uma leitura agradável, portanto, e que deixa em aberto muitas possibilidades para o volume seguinte. Gostei.

Sem comentários:

Enviar um comentário