Este não é um livro vulgar. Aqui, cruzam-se os mais improváveis elementos: um homem que, atacado por um animal, é reconstruído por um estranho cirurgião plástico; um cão que, pelas mãos miraculosas do mesmo cirurgião, é reconvertido em mulher; uma luta sanguinária entre os mais improváveis adversários; uma criança que vive num aquário... e toda uma série de figuras e acontecimentos que, posicionados no limite do impossível, criam assim uma sequência de episódios estranhamente intrigantes.
Com um estilo de escrita muito próprio, onde as mais diversas e imagens se associam numa linha de acontecimentos que oscila entre tons de quase ternura e uma violência perturbadora (com muitas outras emoções e impressões ao longo do percurso), não é propriamente uma linha narrativa aquilo que mais se destaca desta leitura. É, sim, um caminho de imagens e de impressões que, de capítulo em capítulo, criam uma sequência muito visual e precisa de situações e de emoções, num imaginário onde muito é estranho e tudo parece ser possível.
No fundo, acaba por ser o choque de todas essas imagens - tão improváveis, mas apresentadas de uma forma tão directa que quase parecem pertencer ao quotidiano de qualquer ser - que deixa uma marca depois de terminada a leitura. Depois de um contacto inicial marcado pelo choque, pelo oscilar de emoções tão diferentes, mas ligadas, afinal, pelas figuras que as vivem, é o percurso da brutalidade à ternura, com todas as suas mudanças e divergências, aquilo que realmente permanece na memória.
Não é propriamente uma leitura fácil. Com a nitidez de imagens que podem ser tão belas como cruéis, este é um livro que, seguramente, poderá abalar sensibilidades. Há, ainda assim, algo de intenso e de fascinante, passado o impacto da estranheza inicial, e esse, acima de tudo esse efeito que torna este livro tão interessante.
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